I Rural Júris: Encerramento debate situação ambiental de Seropédica


O I Rural Júris, realizado pelas turmas do 2º e do 4º período de Direito da UFRRJ, campus Seropédica, encerrou o evento em mais um dia de auditório lotado.
As palestras, realizadas nesta quarta-feira (25) tiveram como tema principal o Meio Ambiente. À tarde de debates teve início com a apresentação de filmes relacionados ao Direito Ambiental e à preservação do meio ambiente, à noite, o evento prosseguiu com a mesa redonda sobre o Aterro Sanitário de Seropédica, com a intervenção da professora Tatiana Cotta, e participação do Advogado da Associação Comercial, Industrial e Agropastoril de Seropédica, Marcus Vinicius Câmara de Oliveira, da Profª. Drª. Maria Hilde de Barros Góes, entre outros convidados.
O evento contou com apoio do Decanato de Graduação e do Supermercado Seropédica. 

Confraternização
Nesta quinta (25) uma festa de confraternização será realizada pelos acadêmicos de Direito, com a participação de acadêmicos de outros cursos, partir das 22h, na Rua 7, nº 342, à 50 m do Bar do Félix.

I Rural Juris: Apresentação sobre Segurança Pública e UPP’s atrai grande público


Em meio a ataques constantes de traficantes no Rio de Janeiro, uma palestra bastante propícia foi realizada no segundo dia do I Rural Júris. Com o tema Segurança Pública e UPP, a mesa redonda contou com a participação do Coronel Ricardo Quemento Lobasso, Comandante da Academia de Polícia Militar Dom João VI, do Subcomanante das Unidades de Policia Pacificadora (UPP’s), Ronal Langres Freitas de Santana, do Profº. Drº. José Danilo Tavares Lobato e da Profª. Drª. Nalayne Mendonça Pinto.
Durante a apresentação, que lotou o auditório Paulo Freire (ICHS), além do próprio tema dos ataques e da suposta relação destes com o crescimento das UPP’s, que foi descartada pelos dois oficiais presentes, também foram explicadas as formas de funcionamento das Unidades, o sistema de formação dos policiais da Academia de Polícia Militar Dom João VI e as conseqüências sociais da entrada das UPP’s nas favelas.
Durante a tarde o debate, realizado pelos acadêmicos do 2º período de Direito / UFRRJ - Seropédica, sob orientação da professora Taíssa Romeiro, abordou o voto e a dicotomia: Direito X Obrigação, que gerou grande participação do público. 
Último dia de evento 
Hoje (24), último dia do evento, o tema Meio Ambiente será o centro dos debates, a partir das 16h será realizado um debate sobre o Direito Ambiental, com a apresentação de filmes e na sequência, às 18h será realizada a mesa redonda sobre o Aterro Sanitário de Seropédica, com a intervenção da professora Tatiana Cotta, com a participação do Advogado da Associação Comercial, Industrial e Agropastoril de Seropédica, Marcus Vinicius Câmara de Oliveira e da Profª. Drª. Maria Hilde de Barros Goes.
O evento está sendo promovido pelo curso de Direito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), no Instituto de Ciências Exatas e Humanas da Universidade.

Rural Juris: 1º Dia de evento discute Entomologia Forense e Síndrome da Alienação Parental

O primeiro dia do I Rural Júris, realizado pelo curso de Direito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) nesta segunda-feira (22), levou grande público ao auditório Paulo Freire, no Instituto de Ciências Exatas e Humanas da Universidade.
O evento teve início às 13h com a palestra sobre Entomologia Forense, com o professor Alexandre Rodrigues, do Setor de Entomologia Médica e Forense do Instituto Fiocruz. Durante a palestra o professor explicou sobre esta área de atuação e sobre a participação dos insetos na composição do cenário e nas revelações de um crime. Com auditório lotado, Rodrigues foi assistido por acadêmicos de Direito, de Ciências Biológicas, Veterinária, Ciências Sociais, entre outros.
À noite, a apresentação foi realizada pelo psicólogo do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Eduardo Portes Brandão pela Assistente Social também do TJ/RJ, Ana Cristina Cavalcante, e com a participação da professora Luciane Moas. Durante a mesa redonda que discutiu sobre a Síndrome da Alienação Parental, os palestrantes trouxeram a análise de um caso concreto em que se fazia presente o comportamento de alienação por parte da mãe em relação à sua filha, com negações contra seus pais e destacaram a importância da presença do trabalho interdisciplinar na área jurídica, especialmente quando se trata de família.

Segundo dia de evento 
Nesta terça (23) o evento segue com a apresentação do trabalho e debate promovido pelos acadêmicos do 2º período de Direito/ UFRRJ - Seropédica, sob orientação da professora Taíssa Romeiro, no qual irão debater o Voto: Direito X Obrigação
Às 18h  a expectativa está em torno da Mesa Redonda: Segurança Pública e UPP, com o Coronel Ricardo Quemento Lobasso, Comandante da Academia de Polícia Militar Dom João VI, com José Danilo Tavares Lobato e Nalayne Mendonça Pinto.

Último dia de evento 
A quarta-feira (24), data em que encerra o evento será marcado pelo tema Meio Ambiente, a partir das 16h será realizado um debate sobre o Direito Ambiental, com a apresentação de filmes e na sequência, às 18h será realizada a mesa redonda sobre o Aterro Sanitário de Seropédica, com a intervenção da professora Tatiana Cotta, com a participação do Advogado da Associação Comercial, Industrial e Agropastoril de Seropédica, Marcus Vinicius Câmara de Oliveira e da Profª. Drª. Maria Hilde de Barros Goes.


I Rural Juris: Desafios Jurídicos do Século XXI







INSCRIÇÕES:

Para inscrever-se, enviar um e-mail para direitoufrrj@gmail.com com o ASSUNTO: "INSCRIÇÃO I RURAL JURIS" e os seguintes dados:

1) NOME COMPLETO;
2) INSTITUIÇÃO;
3) CURSO;
5) MATRÍCULA;
6) E-MAIL;
7) PALESTRA(S) QUE PRETENDE ASSISTIR.

Depois é só aguardar o e-mail de confirmação.

Entenda o decreto que institui o terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos


O terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, causou uma crise entre ministros, reações dos militares e críticas da sociedade civil. O texto, aprovado pelo presidente dias antes do Natal, ainda precisa ser encaminhado para análise e aprovação do Congresso. Só depois da aprovação no Congresso é que os projetos se tornam leis.

Leia o PNDH-III na íntegra.

Entre as diversas medidas propostas pelo programa, as que mais têm causado dores de cabeça para o governo foram aquelas relacionadas à criação de uma Comissão da Verdade para investigar abusos cometidos durante o regime militar.

A proposta causou irritação em diversos setores, principalmente nas Forças Armadas, e teria feito até mesmo com que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ameaçasse pedir demissão caso o projeto não fosse revisto.

Na tentativa de acalmar os ânimos dos setores insatisfeitos, Lula assinou nesta quarta-feira (13) um decreto que institui um grupo de trabalho para elaborar um anteprojeto de lei para criar a Comissão da Verdade, retirando, no entanto, alguns trechos que irritaram os militares.


O que é o Programa Nacional de Direitos Humanos?

Lançado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República no último dia 21 de dezembro, o documento é a terceira versão de um programa de direitos humanos do governo federal, sendo precedido pelo PNDH-I, de 1996, e o PNDH-II de 2002, ambos publicados durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso.

O projeto é uma ampla carta de propostas, que inclui medidas sobre temas que vão desde programas para o fortalecimento da agricultura familiar até ações relativas à saúde, como o apoio do governo a projetos de lei sobre a descriminalização do aborto, passando pelos direitos das minorias e mecanismos de monitoramento de veículos de comunicação.

Algumas dessas propostas foram criticadas por membros da Igreja Católica, ruralistas, entidades representantes de canais de televisão, jornais e revistas, além de membros do próprio governo.

Ao todo, o decreto assinado pelo presidente Lula defende a aprovação de mais de 20 leis, que ainda precisam ser analisadas pelo Congresso.


O que o plano diz sobre a Comissão Nacional da Verdade?

Embora diversas propostas do programa tenham causado protestos de vários setores, alguns dos pontos mais polêmicos do documento encontram-se no chamado Eixo Orientador VI, que propõe medidas sobre o “Direito à Memória e à Verdade” em relação ao período militar.

O ponto que mais causou tensões foi a chamada Diretriz 23, que apresenta como objetivo estratégico “promover a apuração e o esclarecimento público das violações de Direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política ocorrida no Brasil” durante o regime que vigorou entre 1964 e 1985.

Para isso, o programa propõe a criação de um grupo de trabalho formado por membros da Casa Civil, dos Ministérios da Justiça e da Defesa e da Secretaria Especial de Direitos Humanos para elaborar, até o próximo mês de abril, um projeto de lei que institua uma Comissão Nacional da Verdade, que teria a tarefa de examinar abusos cometidos durante o regime militar.

A criação desta comissão também teria de ser aprovada pelo Congresso Nacional.

Segundo o PNDH-3, entre as atribuições da Comissão Nacional da Verdade estará a de “colaborar com todas as instâncias do poder Público para a apuração de violações de Direitos Humanos, observadas as disposições da Lei Nº 6.683, de 28 de agosto de 1979”, que é conhecida como Lei de Anistia.

Além disso, a Comissão também teria o objetivo de “identificar e tornar públicas as estruturas utilizadas para a prática de violações de Direitos Humanos, suas ramificações nos diversos aparelhos de Estado e em outras instâncias da sociedade”.

Caso seja criada, a comissão teria apenas papel de investigar os fatos, mas não de punir qualquer um dos implicados, o que cabe apenas à Justiça.


O que mais o documento fala sobre o regime militar?

O PNDH também propõe, entre outros pontos, a supressão da legislação brasileira de normas do período militar que “afrontem os compromissos internacionais e os preceitos constitucionais sobre Direitos Humanos”.

Para isso, seria criado um grupo de trabalho que discutiria com o Congresso a revogação de leis remanescentes do período.

O programa também propõe a identificação e sinalização de locais públicos que “serviam à repressão ditatorial”, além de uma legislação de abrangência nacional que proíba que ruas e prédios públicos recebam o nome de pessoas que “praticaram crimes de lesa-humanidade”.

O governo argumenta que as propostas “fortalecem a democracia” e “neutralizam as tentações totalitárias”.


Quais foram as reações negativas à proposta?

Embora o programa tenha sido bem recebido por entidades defensoras dos direitos humanos, a OAB e representantes de vítimas de abusos, as propostas em relação ao período militar causaram um grande desconforto em outros setores, principalmente entre os membros das Forças Armadas.

Logo após a assinatura do decreto presidencial, os comandantes do Exército, Enzo Martins Peri, e da Aeronáutica, Juniti Saito, ameaçaram pedir demissão caso os trechos que instituem a Comissão da Verdade não fossem revogados.

Eles teriam declarado ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, que o plano seria “insultuoso, agressivo e revanchista” contra as Forças Armadas. Jobim também teria ameaçado deixar o governo, alegando não ter sido consultado sobre o trecho em questão.

No início de janeiro, os presidentes dos Clubes Militar, Naval e de Aeronáutica, que representam militares da ativa e da reserva, divulgaram um comunicado onde afirmam que a proposta causa "divisão dos brasileiros" e trará à tona "sequelas deixadas por ambos os lados".

O comunicado ainda diz que, caso a Comissão da Verdade seja instituída, ela deveria examinar os crimes cometidos por militantes de esquerda que combatiam o regime, além dos abusos praticados por agentes do governo.

A proposta de proibir que locais públicos possam levar nomes de agentes do regime, assim como a identificação de locais onde teriam ocorrido abusos também foram vistas como persecutórias pelos setores militares.

Além disso, muitos argumentam que as novas medidas iriam comprometer o ambiente de conciliação nacional instituído pela Lei de Anistia, de 1979.


O que dizem os defensores do Plano Nacional dos Direitos Humanos?

Em resposta às críticas, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos divulgou nota onde afirmou que o plano “ficou disponível no site da SEDH durante o ano de 2009, aberto a críticas e sugestões”.

Além disso, defensores da proposta de criação da Comissão da Verdade afirmam que é importante investigar a atuação dos militares durante o regime, já que a atuação dos grupos de esquerda já seria conhecida por meio de relatos e outros documentos.

Para estes grupos, é importante apurar a atuação dos agentes do regime para que seja possível esclarecer, por exemplo, o destino dos cerca de 400 cidadãos que foram mortos ou ainda estão desaparecidos.

Já em relação aos militantes de esquerda que cometeram crimes à época do regime militar, os defensores da proposta argumentam que eles já foram punidos com prisões e até mortes.


O plano prevê a revogação da Lei de Anistia?

Em nenhum de seus trechos, o Programa Nacional de Direitos Humanos cita textualmente a revogação da Lei de Anistia, instituída em 1979 e que determinou a “anistia a todos quantos (...) cometeram crimes políticos ou conexos com estes” entre 1961 e 1979.

Ao enumerar as atribuições da Comissão da Verdade, o PNDH inclusive afirma que o trabalho do grupo deverá observar as disposições da Lei Nº 6.683, de 28 de agosto de 1979, a Lei de Anistia, o que poder ser interpretado como um reconhecimento da legitimidade da legislação.

A Diretriz 25 do PNDH, no entanto - que propõe a “revogação das leis remanescentes do período de 1964-1985 que sejam contrárias às garantias dos Direitos Humanos” -, é vista com desconfiança por diversos críticos, que enxergam no trecho uma possível intenção de revogar a Anistia.

Oficialmente, a Secretaria Especial de Direitos Humanos afirma que o trecho não se refere à Lei de Anistia, mas a outras legislações do período, como a Lei de Imprensa – que foi derrubada pelo STF no ano passado – e a Lei de Segurança Nacional.


É possível revogar a Lei de Anistia?

A questão jurídica sobre a Lei de Anistia é complexa.

Em princípio, por se tratar de uma lei penal, uma eventual mudança não poderia retroagir (ter efeito sobre crimes do passado), a não ser para beneficiar os réus, como estabelece a Constituição em seu artigo 5º.

Por esta interpretação, não seria mais possível punir qualquer pessoa envolvida “nos crimes políticos ou conexos” que foram anistiados pela lei, o que beneficiaria os envolvidos em atos como torturas ou sequestros.

“Qualquer lei penal que venha em prejuízo do réu, por força da Constituição é irretroativa. Ou seja, admitindo-se que os torturadores ou os terroristas, ou qualquer pessoa que se envolveu em crimes ligados a motivação política na época, admitindo-se que todos eles tenham sido beneficiados pela Lei de Anistia, é constitucionalmente impossível que uma lei venha a cancelar este benefício”, diz Guilherme Guimarães Feliciano, juiz do trabalho e doutor em Direito Penal pela USP.

Outros juristas, no entanto, entendem que seria possível punir alguns crimes praticados por agentes do regime contra opositores, por considerarem que eles não seriam crimes políticos, mas comuns.

Esta é a posição, por exemplo, do Conselho Federal da OAB, que em 2008 entrou com uma ação no STF argumentando que a Lei de Anistia não beneficiaria aqueles que praticaram crimes como a tortura e solicitando que a corte modifique sua interpretação sobre a legislação.

A ação está com a Procuradoria-Geral da República, que deve emitir um parecer sobre a questão antes que ela seja julgada pelo STF.

“Não é questão de rever a Lei de Anistia, mas a interpretação da Lei de Anistia. No entendimento do Conselho Federal da OAB, (...) crimes de tortura, homicídios, não podem ser considerados ilícitos políticos, são crimes comuns e, como se trata de crimes de lesa-humanidade, como a tortura, são imprescritíveis”, afirma Wadih Damous, presidente da OAB do Rio de Janeiro.


Como o presidente Lula reagiu às divergências?

A tensão causada pelo plano atingiu em cheio o governo Lula logo na volta das férias do presidente, na segunda-feira.

Dois dias depois, na quarta-feira (13), Lula se reuniu com os ministros Nelson Jobim e Paulo Vannuchi para tentar aparar as arestas relativas ao programa.

Após a discussão, onde um consenso teria sido alcançado, o presidente assinou Clique um decreto que institui um grupo de trabalho que elaborará um anteprojeto de lei para a criação da Comissão Nacional da Verdade.

O novo decreto traz uma ligeira modificação em relação ao texto que aprovou o PNDH-3, em dezembro. O programa original, no entanto, não foi modificado.

Foi suprimido do novo texto o trecho que dizia que a Comissão da Verdade iria promover a apuração das "violações de Direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política".

O novo decreto diz apenas que a Comissão deverá "examinar as violações dos Direitos Humanos praticadas" no período de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988.

Um dos trechos que também tinham causado insatisfação entre os militares foi mantido, no entanto. É o que diz que a Comissão pretende tornar "públicas as estruturas utilizadas para a prática de violações de direitos humanos, suas ramificações nos diversos aparelhos de Estado, e em outras instâncias da sociedade".

O decreto estabelece que o grupo de trabalho tem até abril para encaminhar o anteprojeto ao presidente Lula.


Entenda alguns pontos polêmicos do programa:

Comissão Nacional da Verdade – ponto mais polêmico do PNDH, é criticado por militares. A Comissão Nacional da Verdade tem como objetivo investigar a violação dos direitos humanos na época da ditadura militar. Nas investigações, uma comissão especial vai poder pedir documentos públicos e privados que ajudem a identificar torturadores e vítimas da ditadura. Militares também poderão ser interrogados sobre casos de violação dos Direitos Humanos na época da ditadura militar.

Aborto – o texto apoia a aprovação do projeto de lei para descriminalizar o aborto e é criticado pela igreja. O projeto afirma que as mulheres têm “autonomia” sobre seus corpos para decidir sobre o aborto. Além disso, o texto recomenda que o Congresso altere o Código Penal, descriminalizando a prática do aborto.

União civil entre pessoas do mesmo sexo – outro ponto de divergência entre o governo e a igreja. Prevê o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo, sugerindo que o Congresso altere a legislação. O PNDH também propõe que casais do mesmo sexo ganhem o direito à adoção.

Reintegração de posse – principal ponto de divergência entre o governo e os ruralistas, a proposta foi criticada pelo ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, que afirmou que o programa é “preconceituoso” com a agricultura comercial. O texto prevê mudanças na lei para dificultar a desocupação de terras invadidas. O projeto sugere a criação de uma câmara de conciliação para mediar o conflito antes da concessão de liminar ou de reintegração de posse, no caso de invasão de propriedade. Na prática isso significa que fica mais difícil tirar invasores de terra.

Rádio e televisão – o texto prevê que emissoras de rádio e televisão podem ter suas concessões cassadas caso transmitam programas que violem os Direitos Humanos. O projeto também cria uma espécie de ranking nacional dos veículos comprometidos e daqueles que violam os Direitos Humanos.





Conjuntura internacional, transformações do Estado, realinhamento e desubstancialização constitucional


1) Introdução

A expressão Estado-Rede, cunhada por Manuel Castells[2], para caracterizar o Estado contemporâneo possibilita uma idéia precisa do modo como o conceito de Estado é posto na atualidade, o que revela determinantes modificações operadas no conhecimento jurídico clássico ou moderno. Neste sentido, não é possível perceber as acentuadas transformações na compreensão do Estado sem ingressar no exame da conjuntura internacional, pois que fenômenos interdependentes. A proposta simples desta monografia é tecer algumas considerações gerais acerca das próximas relações entre a situação sócio-política-econômica-jurídica internacional e a sistemática normativa da vigente Constituição brasileira.

As interações entre o Direito Internacional e o Direito Interno nunca se revelaram tão próximas como no tempo presente. O atual fenômeno da globalização, com a inédita formação dos blocos regionais, ilustra bem a relação que cada vez parece mais estreita entre as ordens interna e externa. Dentre os vários acontecimentos marcantes que melhor identificam o quadro hodierno, a Comunidade Econômica Européia é exemplo primaz, porquanto estruturada sob órgãos supranacionais, tais como o Parlamento Europeu e o Tribunal Europeu. Na Comunidade Européia, a integração é de tal ênfase que está mesmo em vias de debate a implementação de uma Constituição Européia. Em que pese as dificuldades inerentes a estes delicados processos de integração, trata-se de uma operação ampla: econômica, social, política, cultural, jurídica.

Como resta claro, o contato entre o Direito Internacional e o Direito Interno acontece, primordialmente, através do Direito Constitucional. É, por assim dizer, o Direito Constitucional a porta de entrada pela qual o Direito Internacional interage com o ordenamento jurídico pátrio. Daí ficar evidente a importância de se estimular investigações acerca da proximidade entre estas duas disciplinas da Ciência Jurídica. A partir das mencionadas constatações, a doutrina alude até mesmo à existência de um Direito Constitucional Internacional ou de um Direito Internacional Constitucional. Nas produções brasileiras, Celso Duvivier de Albuquerque Mello, em livro de título Direito Constitucional Internacional, averba sobre a matéria: “Na verdade não há um D. Constitucional Internacional claramente delimitado e com normas próprias de interpretação, ou ainda com um conteúdo preciso.”[3]

Apesar dos entraves e das incertezas, próprios inclusive da novidade, da complexidade e da rapidez dos acontecimentos, é necessário passar em revista idéias tradicionais de modo a acompanhar a continuidade e as mudanças do tempo, o que revela ademais a perene busca do Direito para estar em sintonia com os fatos e não obsoleto diante deles. Em uma época de acentuada transição paradigmática[4], expressão da aguda crise de valores e da ruptura (mas ainda não superação) de postulados tradicionais tidos por dogmas (positivismo), faz-se ainda mais imprescindível rever tais e quais institutos no objetivo de contribuir para o progresso científico, isto é, para a atualização do conhecimento.

Sem desconhecer o ensino de Celso Mello de que “o que é Direito Interno e o que é DIP é algo não estabelecido de modo rígido”[5], a linha desta monografia acaba também por fazer algumas proposições a título de revisão da definição de Poder Constituinte Originário, pois que a ser compreendido tendo por base o Direito Internacional contemporâneo. Isto porque, como bem alertado pelo citado professor, “o D. Constitucional está cada vez mais subordinado ao D. Internacional. As normas daquele são limitadas e interpretadas conforme as normas deste.”[6]

Ora, a reformulação do conceito de Estado-Nação, reforma que tem sustento na relativização da idéia de soberania[7], importa revisita, portanto, da própria Teoria Geral do Estado e, por conseguinte, implica na obrigação imperiosa da discussão dos fundamentos de legitimidade da Constituição. E tal ocorre por meio do mais atual e progressista sentido de Constituição: sistema normativo aberto de princípios, regras e procedimentos.[8] É despiciendo afirmar que esta abertura constitucional se dá, em larga escala, em proveito das influências do Direito Internacional. No caso brasileiro, diga-se desde já, por expressa previsão constitucional.

Sobre o assunto, as palavras de Celso Mello: “Parece-nos ser esta a melhor posição para ver uma Constituição, vez que estamos vivendo em uma época histórica de grandes transformações, que ocorrem simultaneamente de modo contraditório impedindo que se possa discernir o seu rumo. Acrescenta-se ainda que a ‘Constituição Aberta’ mostra estar o estado inserido em uma sociedade internacional. Na verdade, a própria palavra ‘estado’ só tem sentido em uma sociedade internacional.”[9] A idéia de abertura (percepção que, aliás, pode ser estendida, respeitadas as peculiaridades inerentes a cada domínio jurídico, a todo o direito positivo) da Lei Fundamental é assente na contemporânea Teoria da Constituição.

Em nossa Dissertação de Mestrado, tivemos a oportunidade de escrever: “Um sistema constitucional normativamente aberto não dá carta branca a qualquer procedimento e decisão implementados no seio social. A Constituição, nesta esfera, limita e, em alguma medida, condiciona os processos comunitários de deliberação na finalidade de estimular a democracia a partir dos direitos fundamentais.”[10] Nos é evidente, e esta é a reformulação teorética que aqui se propugna, que as limitações e condicionamentos que o Direito Internacional impõe ao Direito Constitucional se iniciam ainda no momento da elaboração do texto da Lei Fundamental, isto é, ainda por ocasião do exercício do Poder Constituinte Originário.

Ora, não é possível entender hoje o Poder Constituinte Originário sem dar relevo central aos aportes da Globalização, do Direito Comunitário, do Direito das Organizações Internacionais, do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Com efeito, o Direito Internacional, em considerável medida, conforma procedimental e materialmente a elaboração da Constituição, motivo que justifica um novo olhar sobre a Teoria Piramidal Kelseniana para iniciar a entrever a qualidade da norma fundamental (Grundnorm). A questão enfrentada por esta monografia é de fundo, de fundamento, com o que abarca a forma e o conteúdo. Cumpre, desta feita, analisar o Direito Internacional como instância de legitimidade (mas também de legitimação) para a Constituição desde a sua origem.

Neste cenário identificado também pelas teses Neoliberais, principalmente nos últimos anos vem se alardeando a derrocada da Constituição Dirigente (Estado Social): o que podemos traduzir como a notícia do enfraquecimento ou da perda da sua força normativa. Isto no conjunto dos fenômenos da intitulada Globalização que se conjuga com alguma denominada Pós-modernidade.

Não é raro deparar com assertivas que dizem que a atual crise do Direito é uma crise da Constituição. Por estes pensamentos, a Constituição está em crise e, assim, é a causa da crise maior da regulação jurídica. Como sustentáculo do ordenamento legal, seria a Constituição a grande responsável pela crise do Direito. Desta maneira, o dirigismo constitucional, que estabelece o Welfare State, é atacado por anacrônico, incapaz de atender aos recentes reclames sócio-político-jurídico-econômicos. Cumpre verificar a pertinência destas afirmações.[11]


2) A Conjuntura Internacional Contemporânea: Globalização, Neoliberalismo e Direitos Humanos

É notório que a globalização atinge os fundamentos do Estado-Nação. Importa que se diga, conforme comenta André-Jean Arnaud, que a globalização é um amplo fenômeno “que cobre todos os campos das atividades humanas.”[12] Nesta esteira, observa o autor que “a autonomia dos Estados-nações viu-se bastante comprometida pela interdependência que se desenvolve no seio de uma economia globalizada.”[13]

A integração dos Estados através de blocos regionais, a criação e o reconhecimento de instâncias públicas e privadas supranacionais, o fim do monopólio dos Estados sobre a produção do direito e sobre a coerção legítima, o controle das relações comerciais internacionais por grandes empresas transnacionais, dentre outras características, revelam o que se convencionou chamar de policentralidade. É assim que André-Jean Arnaud anota que o pluralismo contemporâneo é “oriundo da fragmentação das soberanias”[14].

O apontado enfraquecimento do Estado-Nação traz em si a problemática da legalidade constitucional que configura um Estado Social. Como a Constituição social se estrutura frente ao mundo globalizado? É possível perceber um direito globalizado dirigente?[15] As conseqüências da Globalização na soberania estatal inviabilizam ou limitam a normatividade programática da Constituição? Ao que se denota, é necessária uma revisão (o que não significa abandono ou modificação, pois pode-se rever para manter ou reafirmar) ampla de postulados centrais do Direito Constitucional, mas também do Direito Internacional.

Como se sabe, o Neoliberalismo é uma das principais (caso não seja a principal das) manifestações da Globalização.[16] Os princípios neoliberais afetam frontalmente o Estado Social de Direito e, desta maneira, a Constituição Dirigente. Duas vertentes interligadas de mostram nodais: 1ª) a identificação das íntimas implicações entre Estado Social e dirigismo constitucional; 2ª) a revelação das tensas relações entre Neoliberalismo, Estado Social, pensamento moderno, pensamento pós-moderno e Constituição Dirigente. Nesta quadra, vale inquirir: o pós-positivismo se iguala ao pós-moderno?[17]

Em função dos contornos deste monografia, interessa observar apenas que as doutrinas pós-modernas se voltam para a configuração do Estado. Assinala Rouanet: “Os teóricos do pós-moderno são surpreendentemente omissivos com relação ao Estado.”[18] Adverte Rouanet que “a maioria da humanidade vive ainda um estágio pré-industrial”[19]. Por ser assim, apesar das críticas cabíveis, grande parcela do projeto moderno precisa ser retomado para ser efetivado. Ele não é ultrapassado ou extinto, mas sim incompleto. Rouanet propõe a nomenclatura neomoderno: “o prefixo significa uma nova partida e ao mesmo tempo um reencontro com a modernidade.”[20]

Sobre a questão, comenta Luís Roberto Barroso: “Como se percebe, o projeto da modernidade não se consumou. Por isso não pode ceder passagem. Não no direito constitucional. A pós-modernidade, na porção em que apreendida pelo pensamento neoliberal, é descrente do constitucionalismo em geral, e o vê como um entrave ao desmonte do Estado social.”[21] Percebe-se que a pós-modernidade de cunho neoliberal desconsidera o constitucionalismo vigente. É, logo, uma teoria inconstitucional.

Sobre a Globalização, averba Manuel Castells: “É um processo segundo o qual as atividades decisivas num âmbito de ação determinado (a economia, os meios de comunicação, a tecnologia, a gestão do ambiente e o crime organizado) funcionam como unidade em tempo real no conjunto do planeta. Trata-se de um processo historicamente novo (distinto da internacionalização e da existência de uma economia mundial) porque somente na última década se constituiu um sistema tecnológico (telecomunicações, sistemas de informação interativos e transporte de alta velocidade em um âmbito mundial, para pessoas e mercadorias) que torna possível essa globalização.”[22]

Castells alerta que “globalização, desregulação e privatização tornaram-se processos estreitamente relacionados, embora não necessariamente (e isto é fundamental) com os mesmos ritmos e com a mesma extensão.”[23] É nesta problemática muito complexa e variante que se situam os impactos de um fenômeno internacional ainda não totalmente assimilado e muito pouco controlado ou previsível pelo Direito Constitucional.


3) Transformações do Conceito de Estado: o Estado Social e o Estado-Rede

Em primeiro lugar, cumpre assimilar a evolução do conceito de Estado em consonância com o progresso das dimensões dos direitos fundamentais. Calha salientar que as ditas dimensões são as várias faces dos referidos direitos, ou seja, constituem uma unidade.[24] É perceber em uma mesma trajetória o Estado e os direitos fundamentais.

Importa verificar quais as tarefas estatais diante das dimensões dos direitos fundamentais: condutas negativas e positivas. Não basta que o Poder Público não agrida os direitos fundamentais, porquanto é necessário que também atue em prol da efetivação dos mesmos. Dentre outras proposituras, a problemática remete à estrutura funcional interna do Estado, quando, então, se discute, por ex., o princípio da separação de Poderes e o princípio federativo. Por outro lado, remete às relações entre o Estado e as pessoas (tomadas individual e socialmente). Outrossim, remete ao plano internacional, isto é, aos diversos modos de contato entre países.

É perguntar: a contemporânea normatividade dos direitos fundamentais (em todas as suas dimensões) requer qual modelo de Estado? São a normatividade e a hermenêutica constitucionais de acordo com as demandas próprias desses direitos? Quais as responsabilidades estatais? Quais os direitos subjetivos de exigir condutas omissivas e comissivas do Poder Público? Qual o papel do Poder Judiciário nesta dinâmica?

Em análise do quadro mundial, escreve Manuel Castells: “A disciplina dos mercados sobre as políticas econômicas nacionais significa a perda, definitiva, da soberania econômica nacional – ainda que não a perda da capacidade de intervenção.”[25] Não sem demonstrar, a nosso ver, um certo fatalismo, conclui o autor: “Em outras palavras, os Estados, todos os Estados, têm de navegar no sistema financeiro global e adaptar suas políticas, em primeiro lugar, às exigências e conjunturas desse sistema.”[26]

Vale reiterar, portanto, que tudo o que foi exposto até agora impõe a obrigação de se estabelecer a natureza mesma do Estado, sendo certo que o Estado, tal como o direito, é fenômeno social e, como tal, varia no tempo e no espaço. Está imerso no contato delicado entre o ser e o dever-ser, isto é, no contato dialético entre o fato e a norma, entre o descritivo e o prescritivo.

Ao verificar a perda de parcelas da soberania estatal, Castells assevera: “O estado perde soberania, mas não capacidade de ação.”[27] Segundo o que expõe o autor, importa afirmar que não se desmerece a capacidade do Estado em direcionar os fragmentados e complexos fenômenos contemporâneos próprios da Globalização, porquanto “o Estado, em seus distintos níveis, é o principal instrumento de que os cidadãos dispõem atualmente para controlar a globalização em razão de seus valores e interesses.”[28] Nada obstante, escreve: “O Estado-nação herdado da era industrial não é esse instrumento.”[29] E esse é o grande problema e desafio da Teoria da Constituição: moldar, aceitar e permitir mudanças controladas da natureza (do conceito, das tarefas) do Estado no intuito de corresponder às questões de um mundo integrado (ainda que nem sempre através dos direitos humanos), muito diferente daquele do Iluminismo.

Segundo Manuel Castells, o Estado-Rede implica compartilhar soberania de maneira a flexibilizar a estrutura institucional do Poder Público. A União Européia, no entender do autor, seria o exemplo que mais se aproximaria da fórmula do Estado-Rede.[30] O Estado-Rede representaria “uma difusão do poder de centros para o poder de redes, exercido conjuntamente por diferentes soberanos parciais.”[31] Trata-se de uma redefinição do Estado-Nação.[32] Nos termos de Castells: “O Estado que denomino Estado-rede se caracteriza por compartilhar autoridade (ou seja, a capacidade institucional de impor uma decisão) através de uma série de instituições. Uma rede, por definição, não tem centros e sim nós, de diferentes dimensões e com relações internodais que são freqüentemente assimétricas.”[33]

Um dos princípios de funcionamento administrativo do Estado-Rede é o princípio da subsidiariedade: o Estado (âmbito público) deve ser substituído pela sociedade (âmbito privado) em tudo aquilo em que a presença estatal não seja necessária. “Daí a conveniência de privatizar toda aquela atividade produtiva na qual o Estado não tenha vantagem comparativa.”[34] O problema está em definir quais as áreas em que o Estado deve atuar e como deve se operar esta atuação. E tais opções trazem uma carga ideológica determinante. Para o citado professor, a organização e atuação do Poder Público devem ser informadas pelo princípio da flexibilidade que exige um Estado que seja negociador e interventor em questões estratégicas.

Nesta seara, ponto central é atestar se o Estado Social é compatível ou incompatível com o Estado-Rede de Castells. Isto tendo sempre em vista que a normatividade constitucional brasileira alberga o Estado Social, o que quer dizer que a aceitação jurídica do Estado-Rede deve ser promovida com temperamentos de modo a não afrontar o sistema da Constituição. O denominado processo constitucional de abertura não pode, sob pena de subverter a hierarquia da ordem normativa, desprezar a materialidade estável da Constituição.[35] Em termos de uma possível ruptura com os valores da Constituição, o Estado-Rede, caso viesse a se contrapor ao Estado Social, só poderia encontrar sede jurídica de lege ferenda.


4) Reflexo Constitucional: Realinhamento e Desubstancialização

Segundo assinala Celso Mello, o Direito Internacional dos Direitos Humanos é “o conjunto de normas que estabelece os direitos que os seres humanos possuem para o desenvolvimento da sua personalidade e estabelece mecanismos de proteção de tais direitos.'[36] Originado, em grande parte, do Direito Internacional Humanitário que corresponde aos direitos fundamentais contemplados pelo Direito de Guerra, o Direito Internacional dos Direitos Humanos significa hoje o reconhecimento jurídico supranacional dos direitos fundamentais de todo homem.

A internacionalização dos direitos humanos é um fenômeno que bem caracteriza o século XX, notadamente nas décadas que se sucederam ao fim da II Grande Guerra (1945). Percebeu-se que para a efetividade dos direitos humanos se faz imprescindível a sua garantia internacional, isto é, um campo supranacional de efetivação, mesmo porque são os Estados, direta ou indiretamente, seus maiores violadores. Nesta linha, vários tratados foram celebrados, tais como: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, Convenção Americana de Direitos Humanos, Convenção Sobre os Direitos da Criança, entre outros. Deu-se ocasião, portanto, ao estabelecimento de um conjunto normativo identificador do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Cabe ainda ressaltar que os direitos humanos precisam ser tomados em uma unidade no que se refere as suas dimensões ou gerações. Em nossa Dissertação de Mestrado, escrevemos: “Os direitos fundamentais precisam ser tomados na sua totalidade, pois a divisão em dimensões não quer exprimir um hiato ou uma independência entre as fases (faces) destes direitos. As dimensões se somam obrigatoriamente para a compreensão fiel do que sejam os direitos fundamentais: há uma dependência intrínseca entre elas. Neste inter-relacionamento, as dimensões anteriores exigem o aparecimento das posteriores e sofrem as subseqüentes modificações de sentido. Os influxos entre as dimensões possibilitam a unidade dos direitos fundamentais. Esta unidade das dimensões dos direitos fundamentais é que vai propiciar a melhor leitura do art. 60, § 4º, IV, da CF, porquanto o resultado literal (restritivo) deste preceito não prospera.”[37] Esta posição encontra alicerce, entre outros, em Celso Mello e em Ingo Sarlet.[38]

O art. 5º, § 2º, da Constituição de 1988, é norma que ilustra o ingresso do Direito Internacional dos Direitos Humanos no Direito Constitucional brasileiro, com status de norma constitucional e por um procedimento que prevê a incorporação automática, ou seja, de um procedimento que incorpora os tratados de direitos humanos com a ratificação, dispensando ato formal de incorporação (próprio da Teoria Dualista), o decreto presidencial de promulgação. Por fim, cumpre afirmar que, em matéria de direitos humanos, o conflito entre tratado e Constituição é resolvido pela adoção do princípio da norma mais benéfica, princípio que inclusive pode ser percebido na disposição do art. 4º, II, da Lei Fundamental brasileira.[39]

Todavia, muitas vezes, os acontecimentos passam de modo dialético. Ao mesmo tempo que são envidados esforços para se consolidar a ordem internacional como terreno seguro e eficaz de proteção dos direitos humanos contra violações (comissivas ou omissivas) internacionais e nacionais, a Globalização Neoliberal caminha em direção oposta com as suas campanhas de desregulamentação ou descaso para com as legislações sociais e com as suas propostas de Estado Mínimo na meta de deixar ao livre comércio a realização do bem estar social.[40]

A percepção de que existe uma tendência, impulsionada pela Globalização, pelo Neoliberalismo e por teorias intitulas de Pós-modernas, de desubstancialização dos valores constitucionais diz propriamente com a normatividade da Constituição de 1988. Propaga-se o esvaziamento da matéria constitucional, especialmente das normas principiológicas (mais fluidas por natureza) e daquelas chamadas programáticas. Trata-se, pois, de problema inerente aos direitos fundamentais. Outrossim, a questão remete aos modos de abertura do sistema jurídico. Por outro lado, é manifesto que a desubstancialização da Constituição altera o conceito de Estado, porquanto tem repercussão no campo das normas que estabelecem meios e fins e que elegem causas para as ações do Poder Público, quando importa na compreensão das normas de organização[41].

Pode-se observar que a desubstancialização da Lei Fundamental acarreta uma relativização da axiologia constitucional. Dentre outras causas, tal fato é tributário do pragmatismo que caracteriza parcela da Pós-modernidade. Em recente artigo, Oscar Vilhena Vieira faz alusão a um “processo de realinhamento constitucional.”[42] Assenta o autor que “não há dúvida de que o paradigma constitucional está passando por um processo de reformulação.”[43] Ao tratar da Constituição brasileira perante o contexto contemporâneo, escreve Vieira: “No Brasil, em face da amplidão normativa de nossa Constituição, a quase totalidade desse programa neoliberal tem levado o governo a propor um realinhamento da Constituição.”[44] Impera indagar: O que significa este realinhamento constitucional? Ele é inevitável? De que modo deve acontecer? De que modo está acontecendo?


5) Conclusão

Sem o intento de repetir o que já foi dito e sem alongar esta conclusão, queremos tão somente realçar a necessidade de estudos para a revisão de institutos clássicos da Ciência Jurídica. Isto é próprio das épocas de transição ou viragem (Canotilho) paradigmática. Nunca antes o Direito Internacional exerceu tanta influência no Direito Interno. E, por normal, através do Direito Constitucional.

A obrigatoriedade de discutir a relação entre os tratados e a Constituição não pode desprezar o enfrentamento da relação delicada que se põe entre o Direito Internacional e o Poder Constituinte Originário. É aí que começa o problema. Perceber a Constituição vinculada, conformada procedimental e materialmente pelos direitos humanos albergados no Direito Internacional é tomar a sério a proposta de efetivação destes direitos. A tarefa é das mais árduas, porque se contrapõe a fenômenos mundiais que caminham em direções diferentes e mesmo antagônicas, como é o caso do Neoliberalismo.

A internacionalização dos direitos humanos, com a produção de uma farta e muito bem qualificada doutrina, é apoio para a realização dos direitos fundamentais. E, desta feita, não pode ser esquecida, violada pelo Direito Interno. Nestes moldes, a integração entre o Direito Interno (Direito Constitucional, principalmente) e o Direito Internacional (Direito das Organizações Internacionais e Direito Internacional dos Direitos Humanos) é fator de excelente desenvolvimento para a implementação dos direitos fundamentais do homem. No que tange mais especificamente aos embates constitucionais, a problemática está, ainda outra vez e sempre, a espelhar a relação tensa entre Constituição Jurídica e Constituição Real.[45]


6) Apêndice - Natureza do Poder Constituinte Originário: Poder de Direito conformado pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos

A bem da verdade, vale reiterar que a problemática entre o Direito Internacional e o Direito Constitucional começa ainda quando do momento constituinte originário. Esta verificação pode ajudar a aclarar os pontos renitentes nebulosos ou contribuir para resolver os contatos mais delicados e tensos. Daí a inclusão deste tópico como apêndice desta monografia, porque, a nosso ver, foi o Poder Constituinte Originário seriamente atingido pelos aportes mais recentes e progressistas do Direito Internacional contemporâneo, o qual se mostra, acima de tudo, como uma mundialização jurídica dos direitos fundamentais.

Na polêmica antiga e contínua acerca da natureza do Poder Constituinte Originário, fazemos opção convencida pela tese de que o caráter é de Poder de Direito e não Poder de Fato.[46] Apenas em relação ao direito positivo anterior, o Poder Constituinte é inicial, ilimitado, autônomo, incondicionado. Isto porquanto o Poder Constituinte Originário deve obediência ao Direito Natural, conforme já de muito propugnou Sieyés.[47]

Com efeito, o Poder Constituinte Originário não é livre para imprimir qualquer conteúdo à Lei Fundamental, nem livre para adotar qualquer modo de operação. Em uma perspectiva que alia o caráter democrático com a necessidade de um conteúdo justo, a Constituição deve possuir estas duas qualidades. Dizer que uma Constituição é legítima exclusivamente por ser produto de uma deliberação popular é esvaziar a importância da sua materialidade. Caso fosse desta maneira, chegaríamos a conclusão de que a decisão democrática pode tudo. Esta proposição nos afigura inconcebível. A nosso ver, tal seria uma ditadura. Não releva ser uma ditadura de um, de alguns ou de milhares.

Pensamos que a legitimidade da Constituição não se subsume apenas a sua condição de norma promulgada. Exige-se uma outra medida de solidez. Ora, a Constituição – juridicização do fato político – não representa uma simples positivação de poder (força), mas revela sobretudo uma positivação de valores (justiça). E existem valores que obrigatoriamente devem ser contemplados pela Lei Maior, sob pena de desmerecer uma axiologia essencial. Nesta esteira, podemos tomar de empréstimo trecho de Celso Ribeiro Bastos: “Não é toda obra, ainda que promanada de um poder constituinte democrático, que se legitima por si mesma.”[48]

Acreditamos que a legitimidade da Constituição – e daí a sua supremacia – precisa ser aferida em duas frentes: no processo democrático de deliberação e na matéria estatuída. É dizer: a legitimidade é um conceito formal e substancial. E é esta concordância dialética que justifica a superioridade normativa da Lei Magna. Estamos reiterando a bondade intrínseca da Constituição de que fala Canotilho. Destarte, o conteúdo da Constituição deve consonância aos reconhecidos e irrecusáveis direitos fundamentais.

Canotilho, na enumeração das suas teses conclusivas da obra Constituição dirigente e vinculação do legislador, enuncia: “Como a legitimação da ordem constitucional comporta sempre o problema da fixação do justo comum e da forma dessa fixação (processo), é inaceitável reduzir a legitimidade ao aspecto processual, seja em nome do Estado de Direito seja em nome da democracia. Afastam-se, assim, as propostas de reformalização do Estado Constitucional.”[49] Estamos a fazer estas considerações para assinalar que a idéia da razoabilidade se encontra presente ainda no momento constituinte, informando o processo e o seu conteúdo na correspondência que devem guardar com os direitos humanos.[50]

Em opção pela tese do Poder de Direito, escreve Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “O Direito não se resume ao Direito positivo. Há um Direito natural, anterior ao Direito do Estado e superior a este. Deste Direito natural decorre a liberdade de o homem estabelecer as instituições por que há de ser governado. Destarte, o poder que organiza o Estado, estabelecendo a Constituição, é um poder de direito.”[51] Neste diapasão, vale lembrar a célebre passagem de Sieyès: “A nação existe antes de tudo, ela é a origem de tudo. Sua vontade é sempre legal, é a própria lei. Antes dela e acima dela só existe o direito natural.”[52]

Em função do direito positivo, o juízo de identificação com a Lei Maior resulta na atribuição de autoprimazia normativa à Constituição. Testifica Canotilho: “A autoprimazia normativa significa que as normas constitucionais não derivam a sua validade de outras normas com dignidade hierárquica superior. Pressupõe-se, assim, em termos pragmáticos, que a constituição formada por normas democraticamente feitas e aceites (legitimidade processual democrática) e informadas por ‘estruturas básicas de justiça’ (legitimidade material) é portadora de um valor normativo formal e material superior.”[53]

Faz-se necessário, portanto, buscar o sentido deste Direito Natural, já que determinante para a realização do Poder Constituinte Originário. O que é o Direito Natural? Qual a implicação do Direito Internacional nesta dinâmica?

Adotando os riscos da simplificação, pode-se afirmar que existem pelo menos três grandes correntes de pensamento sobre o caráter do Direito: a corrente antropológica, a cosmológica e a teológica.[54] Estas se subdividem em muitas outras linhas de pensamento que possuem muitas vezes diferenças basilares.

Dentre as várias posições, há quem considere o Direito Natural como aquele conjunto de direitos essenciais aceitos pelas nações consideradas civilizadas, há quem preconize que é produto dos costumes e há quem o entenda como provenientes da jurisprudência. O exame específico destes posicionamentos escapa ao plano deste breve estudo. Esta é a esfera para analisar inclusive os Princípios Gerais de Direito, quando considerados provenientes do Direito Natural.

Carlos Maximiliano averba que os Princípios Gerais de Direito são “os pressupostos científicos da ordem jurídica.”[55] Ivo Dantas opina: “Para nós, PRINCÍPIOS são categoria lógica e, tanto quanto possível, universal, muito embora não possamos esquecer que, antes de tudo, quando incorporados a um sistema jurídico-constitucional-positivo, refletem a própria estrutura ideológica do Estado, como tal, representativa dos valores consagrados por uma determinada sociedade.”[56]

Com propriedade, Del Vecchio defende que os Princípios Gerais de Direito não se reduzem a um qualquer direito nacional em particular, mas antes se referem “a las verdades supremas del derecho in genere, o sea a aquellos elementos lógicos y éticos del derecho, que por ser racionales y humanos, son virtualmente comunes a todos los pueblos. La afirmación de que los principios generales del derecho son válidos solamente para cada pueblo particular, es decir, que existen tantas series de principios generales cuantos son los sistemas particulares, además de ser en puridad una contradictio in adjecto, no corresponde ciertamente a la creencia en una ratio juris de carácter universal”.[57]

A posição que é amplamente dominante hoje sobre a fonte do Direito Natural é a que preconiza ser ele determinado com esteio nas produções jurídicas das nações consideradas civilizadas.[58] E aqui a novidade: hoje, estas produções jurídicas são principalmente exercidas através de institutos do Direito Internacional. Vê-se, assim, claramente a relevância do Direito Internacional como referencial para o Direito Natural. Vale dizer que, mais do que todas as outras linhas divergentes de pensamento, é o Direito Internacional contemporâneo que serve de sustentação objetiva para o que se entende por Direito Natural. E com isso grande parte das polêmicas que envolvem o Direito Natural resta superada. Desta feita, resta intrínseca a relação de fundamentação entre o Direito Internacional e o Poder Constituinte Originário.

O Direito Natural, legitimidade para o Poder Constituinte Originário, direito supranacional irrecusável para todos os povos, de índole universal ainda que com componente histórico-cultural, é fincado no Direito Internacional hodierno, estipulado através das Nações e das Organizações Internacionais, identificado com o Direito Internacional dos Direitos Humanos. É o Direito Internacional em posição de superioridade em relação ao Direito Interno, ao Direito Constitucional, desde o tempo da própria construção da Constituição.

Sendo o Direito Internacional contemporâneo a fonte para as normas do Direito Natural, sendo o Poder Constituinte Originário limitado e condicionado por este Direito Natural, o procedimento de elaboração da Constituição e o conteúdo desta mesma Constituição devem obediência aos preceitos que ditam os direitos humanos previstos pelo Direito Internacional.

Esta assertiva enseja uma revisão nuclear na Teoria da Constituição e mais especificamente na Teoria do Poder Constituinte. Mesmo que ainda não seja a posição majoritária entre os constitucionalistas, vozes de autoridade levantam-se em defesa desta nova concepção da origem do fenômeno constitucional. Queremos crer que os fenômenos da Globalização, do Direito Comunitário, entre outros, estão a contribuir cada vez mais para a sedimentação desta nova visão acerca das conformações (limites e condicionamentos) do Poder Constituinte Originário a partir do Direito Internacional.

Contudo, a doutrina brasileira muito pouco vem atentando para o tema. Não obstante a escassez de pronunciamento sobre assunto de tamanha importância, é neste sentido de vanguarda a autoridade de Flávia Piovesan: “o Poder Constituinte dos estados e, consequentemente, das respectivas Constitucionais nacionais, está hoje cada vez mais vinculado a princípios e regras de direito internacional. É como se o Direito Internacional fosse transformado em parâmetro de validade das próprias Constituições nacionais (cujas normas passam a ser consideradas nulas se violadoras das normas do jus cogens internacional). O Poder Constituinte soberano criador de Constituições está longe de ser um sistema autônomo que gravita em torno da soberania do Estado. A abertura ao Direito Internacional exige a observância de princípios materiais de política e direito internacional tendencialmente informador do Direito interno.”[59]

Vale ressaltar que fazemos referência ao termo conformação da do Poder Constituinte Originário. No vernáculo, conformação significa configuração. Conformar é dispor, tornar conforme, conciliar, amoldar, acomodar, ajustar. Sendo assim, empregamos a palavra conformar para abarcar tanto a limitação (dimensão negativa) quanto o condicionamento (dimensão positiva) que decorrem do Direito Internacional.

Ora, a vinculação do Poder Contituinte ao Direito Internacional não se contenta com o estabelecimento de limites, mas exige a imposição de condicionamentos. A limitação possui uma feição negativa (dever de omissão), enquanto que o condicionamento possui uma feição positiva (dever de ação). Como em determinadas vezes se cobra uma abstenção do constituinte e em outras se exige uma atuação, optamos por adotar o vocábulo conformar para englobar os dois mencionados fenômenos.

Assim, com base nos inúmeros tratados que versam sobre direitos humanos é que podemos assegurar que o Poder Constituinte está conformado na forma e na matéria. Isto é: deve ter passado por um procedimento democrático de deliberação e deve ter um conteúdo justo, conforme os direitos fundamentais, quando, então, se menciona uma bondade intrínseca da Constituição. Não parece mais possível advogar uma independência do Poder Constituinte Originário em relação do Direito Internacional, notadamente pela forte e pretensamente irreversível integração entre os Estados.[60] Daí mais uma vez o papel preponderante das Organizações Internacionais em todo este fenômeno.

Sob o domínio legal (forma e conteúdo) do Direito Internacional, o procedimento – como o próprio nome revela – é instrumento da substância, não o contrário. Realizar o conteúdo dos direitos humanos previstos pelo Direito Internacional é o objetivo último do procedimento constituinte. Percebemos o risco do procedimentalismo exclusivista ou exacerbado se perverter em um disfarçado utilitarismo. De qualquer maneira, calha ressaltar a assertiva de André-Jean Arnaud: “A democracia não é, aliás, um tipo de regime bom em si mesmo.”[61]

“Os melhores princípios de moralidade política exigem que sempre se atenda à vontade da maioria?”, indaga Dworkin.[62] Completa o autor: “A pergunta responde por si mesma.”[63] Ao criticar o “relativismo de Walzer”, Dworkin, com toda a razão, leciona que não se pode meramente entregar a justiça à convenção.[64]

Ensina John Rawls: “Nada existe, portanto, que justifique a posição segundo a qual o que a maioria quer está correto.”[65] Assenta Rawls: “Embora em dadas circunstâncias se justifique a afirmação de que a maioria (adequadamente definida e circunscrita) tem o direito constitucional de legislar, isso não implica que as leis elaboradas serão justas.”[66]

É assim que não basta o Direito Internacional fornecer parâmetros de procedimento com vistas a garantir a democracia, mas em primeira medida conferir parâmetros materiais aos quais o procedimento deve se submeter, pois que são seus fins ou justificativas. O Direito Internacional é, pois, conformador, com arrimo nos direitos humanos de todas as dimensões compreendidas de maneira interdependente, do Poder Constituinte Originário, com o que relativiza ainda outra vez o conceito de soberania em prol do próprio homem.

Por todo o exposto, o que mais nos cabe aqui aduzir é que o Direito Internacional dos Direitos Humanos se coloca como pauta indispensável, obrigatória, para o Poder Constituinte Originário. Não se concebe hoje uma Constituição que desrespeite o Direito Internacional dos Direitos Humanos, pois tal representaria uma negação sob qualquer argumento injustificada aos progressos jurídicos na seara dos direitos fundamentais. É o que se pode extrair também do princípio da vedação do retrocesso. O Direito Internacional dos Direitos Humanos significa a sedimentação de um elenco de direitos que não pode ser ignorado a pretexto de peculiaridades culturais ou do pontificado da soberania, porque não há relativismo capaz de desconsiderar os direitos a que todo homem é titular.


Notas

[1] A presente monografia que ora vem a público corresponde, essencialmente, a que foi produzida, em finais do primeiro semestre de 2003, como trabalho conclusivo da Disciplina Política Internacional Contemporânea, no seguimento do Doutorado em Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A Disciplina foi ministrada pelo Professor Doutor Antônio Celso Alves Pereira que, mais do que com o ensino profundo e crítico, presenteia seus alunos com o exemplo e com a amizade.
Este trabalho é dedicado, especialmente, a minha avó Hilda. Pessoa tão doce. E para Larissa, cada vez mais brilhante nos caminhos do Direito, como todo o mais.
[2] CASTELLS, Manuel. Para o Estado-rede: globalização econômica e instituições políticas na era da informação. In: Sociedade e Estado em transformação (Luiz Carlos Bresser Pereira, Jorge Wilheim e Lourdes Sola, Orgs.). São Paulo, UNESP, ENAP, 1999, p. 147-171.
[3] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Direito Constitucional Internacional. 2ª ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 5.
[4] Sobre o conceito de transição paradigmática, consulte-se SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. 1.v. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2001. Na doutrina brasileira, OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Por uma teoria dos princípios: o princípio constitucional da razoabilidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 1-16.
[5] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Cit., p. 16.
[6] Idem, p. 5.
[7] Consulte-se, ARNAUD, André-Jean. O direito entre modernidade e globalização: lições de filosofia do direito e do Estado. Tradução por Patrice Charles Wuillaume. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
[8] Na doutrina estrangeira, v., dentre outros, ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução por Ernesto Garzón Vades. Madri: Centro de Estudios Constitucionales, 1993; HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução por Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997. Na doutrina brasileira, OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Cit., p. 28-39.
[9] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Cit., p. 11.
[10] OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Cit., p. 32.
[11] Todavia, aqui não é a sede para a investigação que este complicado e polêmico tema exige. Vamos tão só pincelar alguns aspectos do debate. Um estudo concentrado sobre o dirigismo constitucional é a proposta que vimos levando avante na nossa Tese de Doutorado.
[12] ARNAUD, André-Jean. O direito entre modernidade e globalização: lições de filosofia do direito e do Estado. Tradução por Patrice Charles Wuillaume. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 28.
[13] Idem, p. 154.
[14] Idem, p. 214.
[15] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Rever ou romper com a Constituição dirigente? Defesa de um constitucionalismo moralmente reflexivo. In: Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política: São Paulo: RT, ano 4, n. 15, p. 7-17, abr./jun. 1996.
[16] Sobre as teorias liberais e a globalização, veja-se o excelente livro, recém lançado no Brasil, do Professor Doutor António José Avelãs Nunes, Vice-Reitor da Universidade de Coimbra e Professor da Faculdade de Direito de Coimbra, Neoliberalismo e direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
[17] BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo. In: Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, 5, 2001 – Separata; ROUANET, Sérgio Paulo. As razões do iluminismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. Apesar desta matéria escapar às fronteiras deste trabalho, registre-se que entendemos não existir similitude necessária entre pós-positivismo e pós-moderno.
[18] Idem, p. 236.
[19] ROUANET, Sérgio Paulo. Cit., p. 270.
[20] Idem.
[21] BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro, cit., p. 17.
[22] CASTELLS, Manuel. Cit., p. 149.
[23] Idem, p. 150.
[24] Cf., entre outros, BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 9.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Malheiros, 2000; SARLET, Ingo. A eficácia dos direitos fundamentais. 2.ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
[25] Idem, p. 151.
[26] Idem.
[27] Idem, p. 156.
[28] Idem, p. 165.
[29] Idem.
[30] CASTELLS, Manuel. Cit., p. 163 e p. 164.
[31] Idem, p. 163 e p. 164.
[32] Idem, p. 164.
[33] Idem.
[34] Idem, p. 166.
[35] Sobre as teorias procedimentalistas e materialistas da Constituição, v., na doutrina brasileira, entre outros, OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Cit., p. 28 e ss.
[36] MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público, cit., p. 774.
[37] OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Cit., p. 58 e 59.
[38] MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público, cit., p. 817; SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2.ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
[39] Sobre o assunto, confira-se PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 4ª ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Max Limonad, 2000.
[40] V. AVELÃS NUNES, António José. Neoliberalismo e direitos humanos. Cit.
[41] Cf. BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 3.ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 150.
[42] VIEIRA, Oscar Vilhena. Realinhamento constitucional. In: Direito Global (Coords. Oscar Vilhena Vieira e Carlos Ari Sundfeld). São Paulo: Max Limonad, 1999.
[43] Idem, p. 20.
[44] Idem, p. 42.
[45] Cf. HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução por Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991.
[46] Sobre o tema, v., entre outros, FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. O Poder Constituinte. 3ª ed. rev. ampl. São Paulo: Saraiva, 1999.
[47] SIEYÈS, Emmanuel Joseph. A constituinte burguesa. Tradução por Norma Azeredo. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997.
[48] BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 15.ed. ampl. atual. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 38. Averba Bonavides: “A teoria do poder constituinte é basicamente uma teoria da legitimidade do poder.”
[49] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador. 2.ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. 473.
[50] Vamos retomar este ponto em itens seguintes.
[51] FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional, Curso de direito constitucional. 26.ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 23.
[52] SIEYÈS, Emmanuel Joseph. A constituinte burguesa. Tradução por Norma Azeredo. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p. 94.
[53] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, cit., p. 1.074.
[54] FILHO, Roberto Lyra. Cit., p. 39 e ss.
[55] MAXIMILIANO, Carlos. Cit., p. 295.
[56] DANTAS, Ivo. Princípios constitucionais e interpretação constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1995, p. 59. O autor informa que Manoel Gonçalves Ferreira Filho assevera que “os juristas empregam o termo ‘princípio’ em três sentidos de alcance diferente. Num primeiro, seriam ‘supernormas’, ou seja, normas (gerais ou generalíssimas) que exprimem valores e que, por isso, são ponto de referência, modelo, para regras que as desdobram. No segundo, seriam standards, que se imporiam para o estabelecimento de normas específicas – ou seja, as disposições que preordenam o conteúdo da regra legal. No último, seriam generalizações, obtidas por indução a partir das normas vigentes sobre determinada ou determinadas matérias. Nos dois primeiros sentidos, pois, o termo tem uma conotação prescritiva; no derradeiro, a conotação é descritiva: trata-se de uma ‘abstração por indução’”. Idem, p. 58.
[57] DEL VECCHIO, Giorgio. Cit., p. 49. Sobre a metodologia de pesquisa dos aludidos princípios, continua o professor da Universidade de Roma: “El criterio y fundamento adecuado para la investigación de los principios se encuentra tan sólo en aquel cuerpo de doctrina general acerca del derecho, que no es la obra artificiosa de un pensador aislado, sino que responde a una verdadera y sólida tradición científica, íntimamente ligada a la génesis de las mismas leyes vigentes. Sin que este respeto debido a la tradición doctrinal sea un obstáculo para elaboraciones posteriores de los elementos que constituyen su conjunto; más bien sirve para facilitarlas, en cuanto aquella tradición señala, por medio de bases ya seguras, el plano en que deben moverse los desarrollos ulteriores.” P. 73.
[58] V., por ex., NÁDER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. 18.ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
[59] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, cit., p. 75.
[60] V. BONIFÁCIO, Artur Cortez. Limitações materiais ao Poder Constituinte Originário. In: Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº 42, p. 114-143, 2003.
[61] ARNAUD, André-Jean. Cit., p. 29.
[62] DWORKIN, Ronald. Los derechos en serio. Tradução por Marta Guastavino. Barcelona: Editorial Ariel, 1997, p. 101.
[63] Idem.
[64] Idem, p. 320 e ss.
[65] RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Tradução por Almiro Pisetta e Lenita M.R. Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 395.
[66] Idem.


Bibliografia

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A nova perspectiva do STF sobre o controle difuso: mutação constitucional e limites da legitimidade da jurisdição constitucional


1. Considerações preliminares: a mutação como caminho (ou condição) para a decisão

A recente polêmica que vem sendo travada no Supremo Tribunal Federal a partir da Reclamação 4335-5/AC, cujo relator é o Ministro Gilmar Mendes, não fará da decisão que vier a ser tomada, com certeza, apenas mais um importante julgado. [01] Mais que isso: ao final dos debates entre os Ministros daquela Corte, poder-se-á chegar, de acordo com o rumo que a votação tem prometido até o momento, a uma nova concepção, não somente do controle da constitucionalidade no Brasil, mas também de poder constituinte, de equilíbrio entre os Poderes da República e de sistema federativo. Isto porque a questão está ancorada em dois pontos: primeiro, o caminho para a decisão que equipara os efeitos do controle difuso aos do controle concentrado, que só pode ser feito a partir do que – nos votos – foi denominado de "mutação constitucional", que consistiu, na verdade, não a atribuição de uma (nova) norma a um texto (Sinngebung), mas, sim a substituição de um texto por outro texto (construído pelo Supremo Tribunal Federal); o segundo ponto é saber se é possível atribuir efeito erga omnes e vinculante às decisões emanadas do controle difuso, dispensando-se a participação do Senado Federal ou transformando-o em uma espécie de diário oficial do Supremo Tribunal Federal em tais questões.

É, pois, sobre estes aspectos cruciais que, motivados pela fertilidade do tema e pela responsabilidade como juristas comprometidos com o Estado Democrático de Direito, decidimos propor algumas reflexões sobre a matéria, na intenção de provocar discussões durante o processo decisório no Supremo Tribunal Federal. E a discussão que propomos inicia a partir dos bem fundamentados votos proferidos pelos Ministros Gilmar Ferreira Mendes e Eros Roberto Grau, que, acaso majoritários, estabelecerão uma ruptura paradigmática no plano da jurisdição constitucional no Brasil. Ao não concordarmos com os referidos votos, buscamos trazer alternativas teóricas que possam ser aptas a contribuir com o debate.

Afinal, numa sociedade que se quer democrática, é papel dos juristas comprometidos com essa sociedade contribuir não apenas para a formação de opinião pública especializada, mas também para a cidadania em geral, aprofundando a discussão sobre questões centrais para a realização permanente do Estado Democrático de Direito. Dialogar com as instituições, especialmente com o Supremo Tribunal Federal, e com uma esfera pública ampliada é a razão central que justifica escrever a presente contribuição.


II. A Reclamação 4335-5, o controle difuso e a as conseqüências da nova posição do Supremo Tribunal Federal

Fundamenta o entendimento do Min. Relator Gilmar Mendes o fato de que, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (Rcl. nº 1880, 23.05.2002), o Tribunal reconhece o cabimento de reclamações que comprovem "prejuízo resultante de decisões contrárias às teses do Supremo Tribunal Federal, em reconhecimento à eficácia vinculante erga omnes das decisões de mérito proferidas em sede de controle concentrado" (grifamos).

A questão envolve aspectos sobre a natureza do poder constituinte – e do poder constituinte brasileiro –, num primeiro momento, e, ainda, elementos acerca do caráter sofisticado do controle da constitucionalidade no Brasil, isto é, caracterizado pela co-existência dos modelos de controles concentrado e difuso.

Sendo mais expecíficos e utilizando parte do voto do Min. Eros Grau (concorde com o Relator), na verdade houve a alteração do próprio texto constitucional. Assim, como admite o Min. Eros Grau:

"passamos em verdade de um texto [pelo qual] compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, a outro texto: "compete privativamente ao Senado Federal dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão definitiva do Supremo".

Pacífico é o entendimento do papel das cortes constitucionais e de sua vinculação à Constituição a que devem guardar, nas distintas formas de controle da constitucionalidade. Esta vinculação, longe de decorrer de uma simples retórica da dogmática, resulta da finalidade essencial do constitucionalismo e da natureza concreta dos fatos que se descrevem perante a corte controladora da constitucionalidade. Mesmo nos casos do chamado controle concentrado, qualquer tribunal constitucional somente agirá quando se comprove que a eventual violação da constituição é atual e efetiva, e não uma simples projeção intelectiva.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal em sede de Recurso Extraordinário (art. 103, III, a, b, c, d, da Constituição da República) julga "as causas decididas em única ou última instância", ou seja, julga a aplicação dada à Constituição em situações jurídicas concretas, e não meras teses sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de leis e de atos normativos. O Supremo Tribunal, aqui, não funciona nem mesmo como mera corte de cassação, mas como corte de apelação, cabendo-lhe julgar tanto o error in procedendo quanto o error in iudicando Assim, o resultado da atuação do Supremo Tribunal Federal no controle difuso de constitucionalidade nunca é o julgamento de uma tese, e dessa atuação não resulta uma teoria, mas uma decisão; e essa decisão trata da inconstitucionalidade como preliminar de mérito para tratar do caso concreto, devolvido a ele por meio de recurso, sob pena de se estar negando jurisdição (art. 5.º, XXXV e LV, da Constituição da República).

Esta exigência aplica-se com maior rigor quando se tem diante dos olhos casos que envolvam as chamadas cláusulas pétreas. Não foi outro o entendimento do Tribunal Federal Constitucional alemão quando, em 17 de agosto de 1956, proibiu a existência do Partido Comunista da Alemanha (KPD). Os termos do acórdão nº 14 daquele ano não deixam dúvidas: "Um partido não é inconstitucional quando ele apenas não reconhece os mais elevados princípios de uma livre e democrática ordem constitucional; deve se constatar uma postura mais ativa, agressiva e de luta contra esta ordem existente" [02].

Desta forma, a alegação de que é cabível reclamação contra as "teses" - e não contra os julgados – [03] do Supremo Tribunal Federal incorre na imprecisão inerente ao papel das cortes controladoras da constitucionalidade que é o de agirem somente diante de uma situação contextualizada [04]

Agir no limite de um contexto significa obedecer aos ditames do poder constituído, condição existencial do Supremo Tribunal Federal como poder jurisdicional vinculado à Constituição. Esta compreensão, claro, origina-se do simples fato de que os poderes de um Estado estão submetidos a uma mesma vontade política, objetivamente identificada num determinado percurso histórico das sociedades, ou seja, o instante constituinte. E a importância disso é incontestável, bastando, para tanto, examinar o papel das constituições para a consolidação das democracias no século XX.


III. O sistema atual de controle de constitucionalidade sobre o pano de fundo da tradição do controle difuso: o papel do Senado Federal

A tradição brasileira de controle da constitucionalidade é a de controle difuso. Desde a Constituição de 1891 até a de 1988, o controle difuso foi incorporado ao rol de competências do Poder Judiciário, tendo o Supremo Tribunal Federal como a última instância neste e em todas as outras questões. A partir da Constituição de 1934 até os dias atuais, permanece a competência do Senado Federal de, por meio de resolução, suspender a execução de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Aqui também uma tradição já consolidada no constitucionalismo brasileiro, na medida em que são corridos mais de setenta anos da mencionada realidade institucional. O controle concentrado de constitucionalidade somente apareceu quando da Emenda Constitucional nº 16, de 26 de novembro de 1965, então oferecendo nova redação ao art. 101 da Constituição de 1946, não se confundindo, todavia, com a chamada ação interventiva introduzida em 1934.

Esta realidade permaneceu quase inalterada até, praticamente, 1988. Aqui a redação original da vigente Constituição da República incorporou à ação direta de inconstitucionalidade – ADI - a ação direta de inconstitucionalidade por omissão – ADI por omissão e a ADPF – arguição de descumprimento de preceito fundamental. Somente em 17 de março de 1993, com a Emenda Constitucional nº 3, é que foi introduzida no sistema de controle concentrado da constitucionalidade a ação declaratória de constitucionalidade, diga-se, de passagem, de duvidosa constitucionalidade, dentre outras razões por não possuir similar em qualquer sistema constitucional contemporâneo.

Ainda assim, esses processos de controle concentrado da constitucionalidade aguardaram até o final de 1999 para receberem tratamento legislativo mais específico, o que se deu com as Leis nº 9.868 e nº 9.882 ainda pendentes em parte, todavia, de decisão definitiva por parte do Supremo Tribunal quanto à sua constitucionalidade.

A ADI foi a forma que o constituinte originário encontrou de também envolver a sociedade civil organizada na guarda da Constituição. A objetividade desta observação comprova-se a partir da leitura do rol dos ativamente legitimados para a propositura de ADI: encontram-se no art. 103 da Constituição da República tanto representantes do Estado, como da sociedade. Neste sentido, a tônica democrático-participativa da Constituição se evidencia, já que a própria Constituição não compreende a sociedade sem seus nexos com o Estado e vice-versa (veja-se, já aqui, a importância do alargamento da legitimidade, questão que assumirá relevância no exame da Reclamação sob comento, que "equipara" coisas absolutamente diferentes: uma – a ADI -, ao também atribuir legitimidade processual autônoma a entes da sociedade civil; a outra – o controle difuso -, feita por todos juízes e tribunais, por iniciativa das partes ou de ofício, de modo incidental a processos em que atuem).

Assim, se para alguns, num primeiro momento, teria sido possível afirmar que a ADC seria um "instrumento da governabilidade" – e não da democracia – tal não é mais: após a Emenda Constitucional nº 45/2004, a unificação do rol de ativamente legitimados, em favor de representantes da sociedade civil e de órgãos do Estado para ADI, ADC e ADPF, mostra com clareza que a tarefa do controle concentrado da constitucionalidade é uma missão para todos, e não somente para órgãos estatais.

Esta diferenciação possui outros desdobramentos possíveis no quadro do sistema constitucional. Se o controle concentrado é exercido pelo Supremo Tribunal, por outro lado poderá existir, neste controle, a participação da sociedade civil. A decisão do Supremo Tribunal estará, então, legitimada não somente porque emanou da corte que possui em última instância a complexa responsabilidade da guarda da Constituição. Principalmente, a decisão estatal estará legitimada por ser o resultado de um processo jurisdicional em que a sociedade poderá vir a ter participação.

Mas o modelo de participação democrática no controle difuso também se dá, de forma indireta, pela atribuição constitucional deixada ao Senado Federal. Excluir a competência do Senado Federal – ou conferir-lhe apenas um caráter de tornar público o entendimento do Supremo Tribunal Federal – significa reduzir as atribuições do Senado Federal à de uma secretaria de divulgação intra-legistativa das decisões do Supremo Tribunal Federal; significa, por fim, retirar do processo de controle difuso qualquer possibilidade de chancela dos representantes do povo deste referido processo, o que não parece ser sequer sugerido pela Constituição da República de 1988.

Como se não bastasse reduzir a competência do Senado Federal à de um órgão de imprensa, há também uma conseqüência grave para o sistema de direitos e de garantias fundamentais. Dito de outro modo, atribuir eficácia erga onmes e efeito vinculante às decisões do STF em sede de controle difuso de constitucionalidade é ferir os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (art. 5.º, LIV e LV, da Constituição da República), pois assim se pretende atingir aqueles que não tiveram garantido o seu direito constitucional de participação nos processos de tomada da decisão que os afetará. Não estamos em sede de controle concentrado! Tal decisão aqui terá, na verdade, efeitos avocatórios. Afinal, não é à toa que se construiu ao longo do século que os efeitos da retirada pelo Senado Federal do quadro das leis aquela definitivamente declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal são efeitos ex nunc e não ex tunc. Eis, portanto, um problema central: a lesão a direitos fundamentais.

Se a Constituição – seja na sua versão original, seja naquela que decorreu das reformas realizadas pelo poder constituinte derivado – elabora tão preciosa diferenciação entre controle concentrado e controle difuso, não há como se imaginar que os efeitos do controle concentrado sejam extensivos ao controle difuso, de forma automática.

É preciso entender que a questão do papel do Senado no controle difuso de constitucionalidade diz respeito aos efeitos da decisão. Isso parece claro. O texto do art. 52, X, da Constituição do Brasil, somente tem sentido se analisado – portanto, a norma que dele se extrai - a partir de uma análise do sistema constitucional brasileiro. O sistema é misto.

Portanto, parece óbvio que, se se entendesse que uma decisão em sede de controle difuso tem a mesma eficácia que uma proferida em controle concentrado, cairia por terra a própria diferença. É regra que o controle concentrado tenha efeitos ex tunc (a exceção está prevista na Lei nº 9.868/99). O controle difuso tem na sua ratio o efeito ex tunc entre as partes.

Então, qual é a função do Senado (art.52,X)? Parece evidente que esse dispositivo constitucional não pode ser inútil. Veja-se: em sede de recurso extraordinário, o efeito da decisão é inter partes e ex tunc. Assim, na hipótese de o Supremo Tribunal declarar a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em sede de recurso extraordinário, remeterá a matéria ao Senado da República, para que este suspenda a execução da referida lei (art. 52, X, da CF). Caso o Senado da República efetive a suspensão da execução da lei ou do ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, agregará aos efeitos anteriores a eficácia erga omnes e ex nunc. Nesse sentido, "(...) há que se fazer uma diferença entre o que seja retirada da eficácia da lei, em sede de controle concentrado, e o que significa a suspensão que o Senado faz de uma lei declarada inconstitucional em sede de controle difuso. Suspender a execução da lei não pode significar retirar a eficácia da lei. Caso contrário, não haveria diferença, em nosso sistema, entre o controle concentrado e o controle difuso. Suspender a vigência ou a execução da lei é como revogar a lei. Pode-se agregar ainda outro argumento: a suspensão da lei somente pode gerar efeitos ex nunc, pela simples razão de que a lei está suspensa (revogada), à espera da retirada de sua eficácia. Daí a diferença entre suspensão/revogação e retirada da eficácia. Sem eficácia, a lei fica nula; sendo nula a lei, é como se nunca estivesse existido. Não se olvide a diferença nos efeitos das decisões do Tribunal Constitucional da Áustria (agora adotada no Brasil), de onde deflui a diferença entre os efeitos ex tunc (nulidade) e ex nunc (revogação). Dito de outro modo, quando se revoga uma lei, seus efeitos permanecem; quando se a nulifica, é esta írrita, nenhuma. Não fosse assim, bastaria que o Supremo Tribunal mandasse a lei declarada inconstitucional, em sede de controle difuso, ao Senado, para que os efeitos fossem equiparados aos da ação direta de inconstitucionalidade (que historicamente, seguindo o modelo norte-americano, sempre foram ex tunc). Se até o momento em que o Supremo Tribunal declarou a inconstitucionalidade da lei no controle difuso, a lei era vigente e válida, a decisão no caso concreto não pode ser equiparada à decisão tomada em sede de controle concentrado. Repetindo: a valer a tese de que os efeitos da decisão do Senado retroagem, portanto, são ex tunc, qual a real modificação que houve com a implantação do controle concentrado, em 1965? Na verdade, se os efeitos da decisão desde sempre tinham o condão de transformar os efeitos inter partes em efeitos erga omnes e ex tunc, a pergunta que cabe é: por que, na prática, desde o ano de 1934 até 1965, o controle de constitucionalidade tinha tão pouca eficácia? Desse modo, mesmo que o próprio Supremo Tribunal assim já tenha decidido (RMS 17.976), temos que a razão está com aqueles que sustentam os efeitos ex nunc da decisão suspensiva do Senado" [05].

A discussão sobre se o Senado está ou não obrigado a elaborar o ato é outra coisa. O que está em jogo na presente discussão é a própria sobrevivência do controle difuso e os efeitos que dele devem ser retirados. Não por diletantismo acadêmico-intelectual, mas pela objetiva e singela razão de que a Constituição da República possui determinação expressa sobre o papel do Senado neste sentido e que não foi revogada. Por isso cabe insistir nesse ponto, e não apenas em nome de uma suposta defesa da tradição pela tradição, mas de todo um processo de aprendizagem social subjacente à história constitucional brasileira; e da grave lesão que representa para o "modelo constitucional do processo" e do sistema de garantias constitucionais dos direitos fundamentais a atribuição de eficácia erga omnes de efeito vinculante às decisões do Supremo Tribunal Federal em sede de recurso extraordinário.

E isso envolve uma discussão paradigmática que está presente a todo momento nas presentes reflexões (afinal, o Estado Democrático de Direito é um paradigma constitucional e o que dele menos se pode dizer é que dá guarida a ativismos e decisionismos judiciais).

Parece que a diferença está na concepção do que seja vigência e eficácia (validade). Decidir – como quer, a partir de sofisticado raciocínio, o Min. Gilmar Mendes – que qualquer decisão do Supremo Tribunal em controle difuso gera os mesmos efeitos que uma proferida em controle concentrado (abstrato) é, além de tudo, tomar uma decisão que contraria a própria Constituição. Lembremos, por exemplo, uma decisão apertada de 6 a 5, ainda não amadurecida. Ora, uma decisão que não reúne sequer o quorum para fazer uma súmula não pode ser igual a uma súmula (que tem efeito vinculante – e, aqui, registre-se, falar em "equiparar" o controle difuso ao controle concentrado nada mais é do que falar em efeito vinculante). E súmula não é igual a controle concentrado.

Assim, "se o Supremo Tribunal Federal pretende – agora ou em futuros julgamentos - dar efeito vinculante em controle difuso, deve editar uma súmula (ou seguir os passos do sistema, remetendo a decisão ao Senado). Ou isso, ou as súmulas perderam sua razão de ser, porque valerão tanto ou menos que uma decisão por seis votos a cinco (sempre com o alerta de que não se pode confundir súmulas com declarações de inconstitucionalidades). (...) Uma decisão de inconstitucionalidade – em sede de controle dito "objetivo" (sic) - funciona como uma derrogação da lei feita pelo Poder Legislativo. O Supremo Tribunal Federal, ao declarar uma inconstitucionalidade no controle concentrado, supostamente funciona como "legislador negativo" (sic). Por isso também são bem distintos os efeitos das decisões de inconstitucionalidade em países que possuem controle difuso ou controle misto (concentrado-difuso) e aqueles que possuem apenas o controle concentrado, bastando ver, para tanto, como funcionam os tribunais constitucionais europeus em comparação com os Estados Unidos (controle difuso stricto sensu) ou o Brasil (controle misto). (...) Em face disso é que, em sede de controle difuso, torna-se necessário um plus eficacial à decisão do Supremo Tribunal, introduzido em 1934, com o objetivo de conceder efeito erga omnes às decisões de inconstitucionalidade (hoje o art. 52,X). Observemos: tanto no controle concentrado como no difuso o Supremo Tribunal Federal decide através de full bench. A diferença é que, na primeira hipótese, o controle é "objetivo" (é "em tese", como diz a doutrina, embora saibamos que não há decisões in abstracto); no segundo caso, o julgamento representa uma questão prejudicial de um determinado "caso jurídico". Mas, então, há que se perguntar: se em ambos os casos o julgamento é feito em full bench e o quorum é o mesmo (mínimo de seis votos), o que realmente diferencia as decisões? (...) Mas, se são iguais, porque são diferentes? Aí é que está o problema: as decisões exsurgentes do controle difuso não possuem autonomia, pois dependem do "socorro" do poder legislativo para adquirir força vinculante erga omnes. É uma questão de cumprimento do princípio democrático e do princípio do devido processo legal. É nesse sentido que o Senado, integrante do Poder Legislativo, ao editar a resolução que suspende a execução da lei, atuará não no plano da eficácia da lei (essa é feita em controle concentrado pelo STF), mas, sim, no plano da vigência da lei. Daí que, no primeiro caso – controle concentrado – o efeito pode ser ex tunc; no segundo caso – controle difuso – o efeito somente poderá ser ex tunc para aquele caso concreto e ex nunc após o recebimento desse plus eficacial advindo de um órgão do Poder Legislativo.(...) Na verdade, o que faz a riqueza do sistema são essas possibilidades de divergir. Conseqüentemente, não é qualquer decisão que pode ser vinculante. E isso é absolutamente relevante. Afinal, nosso sistema não é o da common law. Aliás, mesmo no sistema da common law, há que se levar em conta, como bem lembra Dworkin, a força gravitacional dos precedentes. Uma decisão só pode ser considerada como sendo "um precedente" retrospectivamente se for considerado o caso concreto objeto de apreciação aqui e agora. Caso contrário, adotaríamos a tese da aplicação mecânica dos precedentes, típica do positivismo exegético, enfim, do convencionalismo estrito" [06].

Deve, ainda, ser ressaltado que "Se entendermos que uma decisão do Supremo Tribunal Federal em controle difuso vale contra tudo e contra todos, além de ter efeito ex tunc, também teremos que entender que uma decisão afirmando a constitucionalidade de uma lei deve ter igual efeito. E teremos que suportar as conseqüências. E os efeitos colaterais. (...) Assim, por uma exigência de integridade no Direito (Dworkin), parece óbvio afirmar que a norma constitucional que estabelece a remessa ao Senado (art. 52, X) não poderia ser "suspensa" em nome de argumentos políticos ou pragmáticos. [07]

Deixar de aplicar o artigo 52, X, significa não só abrir precedente de não cumprimento de norma constitucional – enfraquecendo sobremodo a força normativa da Constituição – mas também suportar as conseqüências, uma vez que a integridade também supõe integridade da própria Constituição. E, não se pode esquecer que a não aplicação de uma norma é uma forma de aplicação. Incorreta. Mas é. [08].


IV. Controle difuso e controle concentrado no Brasil

A competência do Senado Federal estabelecida pelo art. 52, X da Constituição, para além de se materializar no exercício de uma atribuição do poder constituinte originário, deixa-se refletir, ainda, quando da contextualização de seu lugar constitucional. Espaço de representação política da Federação, ao Senado Federal foi atribuída a competência do art. 52, X da CF porque, racionalmente, somente a um organismo da Federação é que poderia recair a autoridade para suspensão de instrumentos normativos, por exemplo, oriundos de outros entes da Federação, como Estados, Distrito Federal ou Municípios, em razão, especialmente, da amplamente solidificada sistemática de controle da constitucionalidade a inadmitir controle concentrado de espécie normativa municipal diretamente no Supremo Tribunal. Tem-se, então, uma dupla acepção de democracia: a que parte do controle reflexo do povo na eleição de representantes dos entes federados e o trato e o equilíbrio necessários à harmonização do sistema federativo brasileiro.

Como se trata de uma das Casas do Poder Legislativo, o Senado Federal não teria como estar vinculado ao entendimento do Supremo Tribunal, o que também é pacificamente aceito pelo próprio STF. Porém, se o Senado Federal decidir pela suspensão, deverá fazê-lo, nos termos do entendimento esboçado pelo STF, a fim de preservar a autoridade dos julgados deste último. Tem-se aqui, do ponto de vista da idealidade, um sistema de controle bem formulado e, do ponto de vista do realismo, que não tem sido a fonte de martírios para a Constituição da República.

Assim, não parece prosperar o entendimento do Sr. Min. Relator a respeito da evolução das formas e métodos de controle da constitucionalidade, quando recorre especificamente à interpretação conforme a constituição (verfassunsgskonforme Auslegung) ou a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto (Teilnichtigerklärung ohne Normtextreduzierung). O problema afigura-se mais complexo.

Com efeito, declarar a inconstitucionalidade não pode ter os mesmos efeitos que não declarar a inconstitucionalidade (embora esse equívoco tenha sido cometido pelo legislador brasileiro, ao conceder efeitos "cruzados" nas ADIs e ADCs). Isto é, é preciso ter claro que nem mesmo nos sistemas constitucionais que podem ser considerados como "consolidados" como Espanha e Portugal, a afirmação da constitucionalidade (ou, se se quiser, a não pronúncia de inconstitucionalidade) tem efeito vinculante (não esqueçamos, aqui, que a interpretação conforme é uma forma de "afirmação da constitucionalidade" – veja-se, nesse sentido, a opinião de autores como J. J.Gomes Canotilho [09] e Jorge Miranda [10] sobre os efeitos da interpretação conforme a Constituição. Dito de outro modo, eis aqui uma diferença fundamental entre as decisões que acolhem a inconstitucionalidade e as que a desacolhem: as primeiras fazem coisa julgada material; as segundas têm força meramente de coisa julgada formal, não impedindo sequer que o mesmo requerente solicite novamente a apreciação da inconstitucionalidade da norma anteriormente "declarada" (sic) constitucional. Duas razões podem ser elencadas em favor dessa tese, a partir das lições de Rui Medeiros, Miguel Galvão Teles, Ferreira de Almeida e Garcia de Enterría: primeiro, a eficácia geral da declaração de constitucionalidade impediria que, por uma evolução da interpretação das regras constitucionais, resultante da transformação das circunstâncias e das concepções e porventura da própria alteração da mentalidade do tribunal, repusesse-se o problema da validade de normas já anteriormente apreciadas. Ou seja, se tribunal constitucional pudesse declarar a conformidade da norma com a Constituição, estaria a tornar estáticos e rígidos normativos abertos à variação do devir e cujas previsões e estatuições adequam-se ou "desadequam-se" com a mudança natural das coisas. A atribuição de força obrigatória geral à declaração de constitucionalidade dificultaria assim uma interpretação constitucional evolutiva – capaz de adaptar o texto da Constituição às situações históricas mutáveis e susceptível de atender a toda a riqueza inventiva da casuística. O segundo argumento, que não pode ser superado por via dos limites objetivos (identidade da causa de pedir) e temporais do caso julgado (cláusula rebus sic stantibus) – a atribuição de eficácia erga omnes à decisão de rejeição de inconstitucionalidade conferiria ao tribunal – cujas decisões não podem ser corrigidas por nenhum outro órgão – o poder incontrolável de decidir infalivelmente sobre a constitucionalidade da lei, tornando-se um árbitro irresponsável da vida do Estado e dono, em vez de servo, da constituição. De forma contundente, Medeiros acrescenta um argumento avassalador: se a declaração de constitucionalidade tivesse força obrigatória geral, uma decisão do tribunal constitucional que concluísse erradamente pela conformidade à constituição de uma determinada norma envolveria, inevitavelmente, uma alteração da constituição, uma vez que a decisão teria o valor da norma constitucional que serviu de parâmetro e só poderia ser corrigida por emenda constitucional. A recusa de atribuição de eficácia erga omnes à decisão de não-inconstitucionalidade permite, pelo contrário, remediar, através de nova decisão, os possíveis erros precedentemente cometidos na apreciação da constitucionalidade pelo tribunal constitucional [11].

De todo modo – há que se reconhecer -, tais teses não vinga(ra)m em terrae brasilis. Isto porque, em nome de efetividades quantitativas, optou-se, por aqui, em conceder efeito vinculante a qualquer decisão sobre (in)constitucionalidade (e, agora, conforme a tendência do STF, também para decisões em controle difuso de constitucionalidade). Agregue-se que, na Alemanha – e a lembrança é de Helmut Simon - o próprio Tribunal Constitucional já rechaçou sua vinculação a posições prévias e rapidamente realizou alterações nos critérios de julgamento. O Tribunal foi muito criticado porque na sentença sobre o Grundlagenvertrag insistira em demasia a força vinculativa dos fundamentos jurídicos (BverfGE 36, 1 (36)). Especificamente com relação à interpretação conforme, há um acordo em relação a que unicamente pode ser vinculante o veredicto acerca de interpretações contrárias à Constituição (BverfGE 40, 88 (93 s.)), assim como a resolução do Pleno (BverfGE 54, 277). Tal interpretação compadece bem com a idéia dinâmica que deve ter uma Constituição, assim como o fato de que é tarefa do Bundesverfassungsgericht defender a Constituição e não se dedicar a canonizar suas posições de outro tempo. Uma idéia restritiva da força vinculante parece mais aconselhável que proibições constitucionais, que, em caso de erro, resultam dificilmente corrigíveis, além de que a simples ameaça de que se vá buscar guarida junto ao tribunal constitucional gera reações antecipadas de preparação de novos projetos de lei. [12]

Portanto – e isso se afigura como extremamente relevante - também poderíamos questionar até mesmo o fato de a interpretação conforme a constituição ou a declaração parcial de inconstitucionalidade possuírem efeito vinculante e eficácia erga omnes (embora a Lei 9.868/99 aponte em sentido contrário).

Já no caso de controle difuso de constitucionalidade – peculiaridade nossa e de Portugal - o próprio Supremo Tribunal sempre teve ciência (isto é, esteve concorde) de que não há a possibilidade de dar efeito erga omnes às decisões proferidas nessa modalidade, necessitando da intervenção do Senado Federal (afinal, embora o próprio Supremo Tribunal não estar cumprindo, de há muito, a determinação constante no art. 52, X, da CF). E, por fim, se se trata de súmula vinculante sabe-se que é despicienda qualquer participação do Senado Federal. Qual a razão de tais conclusões? A resposta parece simples: isto é assim em face das determinações que integram a Constituição Federal por decisão do poder constituinte originário e derivado.

Dizendo de outro modo, a argumentação constante do voto do Sr. Min. Relator de que o próprio Supremo Tribunal Federal optou pela dispensabilidade de se encaminhar ao Pleno da Corte decisão tomada por uma de suas Turmas sobre constitucionalidade/inconstitucionalidade, desde que já tenha ocorrido manifestação do Supremo Tribunal Federal no mesmo sentido, não pode ser comparada ao caso que se tem em exame. No caso, não se extrapola o limite de poder concedido pela Constituição. Não se invade esfera outra de poder.

Já para a situação que almeja a extensão dos efeitos de controle concentrado ao difuso, não há nada que autorize o Supremo Tribunal Federal a operar mencionada sistemática no texto de nossa Constituição, tampouco na tradição de nossa doutrina de controle da constitucionalidade. Portanto, o primeiro caso é aceitável porque se tem uma inovação produzida no âmbito de uma competência constitucionalmente delineada e já consolidada. No segundo – não somente pela razão de ser novo posicionamento – mas, fundamentalmente, por não encontrar respaldo autorizador constitucional expresso, exigência igualmente razoável em virtude de termos um sistema jurídico escrito, herdeiro da noção romano-germânica de direito. Ao contrário: o art. 52, X aponta em outro sentido.

Na verdade, há uma questão que se levanta como condição de possibilidade na discussão acerca da validade (e da força normativa) do art. 52,X, da Constituição do Brasil. Trata-se de uma questão paradigmática, uma vez que sua ratificação (o que vem sendo repetido pelo menos desde 1934), em uma Constituição dos tempos de Estado Democrático de Direito, dá-se exatamente pela exigência democrática de participação da sociedade no processo de decisão acerca da (in)constitucionalidade de uma lei produzida pela vontade geral.

Por isso, o art. 52,X é muito mais importante do que se tem pensado. Ele consubstancia um deslocamento do pólo de tensão do solipsismo das decisões do judiciário em direção da esfera pública de controle dessas decisões. Nesse aspecto, o constitucionalismo do Estado Democrático de Direito deve ser compreendido no contexto da ruptura paradigmática ocorrida no campo da filosofia. Dito de outro modo, o direito não está imune ao pensamento que move o mundo. Mundo é mundo porque é mundo pensado. Conseqüentemente, a derrocada do esquema sujeito-objeto (ponto fulcral das reflexões das teorias democráticas que vão desde as teorias do discurso à hermenêutica) tem repercussão no novo modelo de Estado e de direito exsurgido a partir do segundo pós-guerra. O sujeito solipsista (Selbstsüchtiger) dá lugar à intersubjetividade. Veja-se o problema ocasionado pela prevalência do velho paradigma representacional (sujeito-objeto) nas diversas reformas no processo: cada vez mais se coloca o procedimento à disposição do pensamento "justo" do juiz, valendo, por todos, citar a assim denominada "instrumentalidade do processo" (por todos, Candido Dinamarco e José Bedaque). Cada vez que se pretende "processualizar mais o sistema", ocorre uma diminuição do processo enquanto instrumento de garantia do devido processo legal. Ora, se o devido processo legal serve para preservar direitos, não é em nome dele que se pode fragilizar o próprio processo. Dia-a-dia, o sistema processual caminha para o esquecimento das singularidades dos casos. Trata-se, pois, de um novo princípio epocal. Na verdade, se o último princípio epocal da era das duas metafísicas foi a vontade do poder (Wille zur Macht), o novo princípio, forjado na era da técnica, acaba por se transformar no mecanismo que transforma o direito em uma mera racionalidade instrumental (lembremos, sempre e novamente, as escolas instrumentalistas...!). Manipulando o instrumento, tem-se o resultado. Ao final dessa "linha de produção", o direito é (será) aquilo que a vontade do poder quer que seja. Chega-se ao ápice da não democracia: o direito transformado em política. Não que direito e política estejam cindidos. Parece despiciendo qualquer comentário acerca dessa problemática (pensemos, por exemplo, na doutrina de Hans P. Schneider). O que ocorre é que a relação direito-política não pode criar/estabelecer uma contradição em si mesmo, ou seja, se o direito serve para controlar/garantir a democracia (e, portanto, a política), ele não pode ser a própria política.


V. O problema da mutação constitucional e os limites da jurisdição. Da alteração da norma de um texto para a alteração do próprio texto.

Finalmente, uma questão não pode ser olvidada. O século XX foi atravessado por duas grandes revoluções que dizem respeito diretamente ao direito e à filosofia, transformando-se em condições de possibilidade para a compreensão dos fenômenos jurídico-políticos ocorridos principalmente a partir do segundo pós-guerra.

De um lado, o constitucionalismo compromissório e principiológico com feições claramente diretivas (tese que continuamos a defender), firmando o compromisso do povo para com as transformações sociais historicamente sonegadas, circunstância que assume foros de dramaticidade em países de modernidade tardia como o Brasil. Isso significa que o compromisso primordial de uma constituição é a democracia e a realização dos direitos fundamentais (promessas da modernidade).

A segunda revolução copernicana é a superação do esquema sujeito-objeto, que proporciona o derrota das posturas subjetivistas-solipsistas. E parece não haver dúvida de que o Estado Democrático de Direito dá-se no entremeio dessa reviravolta lingüística. Na verdade, o linguistic turn não foi devidamente recepcionado no campo do direito brasileiro; melhor dizendo, a viravolta linguística foi mal compreendida pela tese da mutação constitucional. O direito – compreendido no interior dessa ruptura paradigmática – não pode ser entendido como espaço de livre atribuição de sentido; essa questão assume especial relevância quando se trata do texto constitucional. Ou seja, em determinadas situações, mutação constitucional pode significar, equivocadamente, a substituição do poder constituinte pelo Poder Judiciário. E, com isso, soçobra a democracia. E este nos parece ser o ponto principal da discussão acerca dos votos proferidos na aludida Reclamação 4335-5.

Numa palavra, o processo histórico não pode, desse modo, delegar para o Judiciário a tarefa de alterar, por mutação ou ultrapassagem, a Constituição do País (veja-se, nesse sentido, só para exemplificar e esse é o ponto da presente discussão -, o "destino" dado, em ambos os votos, ao art. 52,X, da Constituição do Brasil).

Paremos para pensar: uma súmula do Supremo Tribunal Federal, elaborada com oito votos (que é o quorum mínimo), pode alterar a Constituição. Para revogar essa súmula, se o próprio Supremo Tribunal Federal não o fizer, são necessários três quintos dos votos do Congresso Nacional, em votação bicameral e em dois turnos. Ao mesmo tempo, uma decisão em sede de controle de constitucionalidade difuso, proferida por seis votos, pode proceder a alterações na estrutura jurídica do país, ultrapassando-se a discussão acerca da tensão vigência e eficácia de uma lei.

Não se pode deixar de frisar, destarte, que a mutação constitucional apresenta um grave problema hermenêutico, no mínimo, assim como também de legitimidade da jurisdição constitucional.

Com efeito, a tese da mutação constitucional é compreendida mais uma vez como solução para um suposto hiato entre texto constitucional e a realidade social, a exigir uma "jurisprudência corretiva", tal como aquela a que falava Büllow, em fins do século XIX (veja-se, pois, o contexto histórico): uma jurisprudência corretiva desenvolvida por juízes éticos, criadores do Direito" (Gesetz und Richteramt, Leipzig, 1885) e atualizadores da constituição e dos supostos envelhecimentos e imperfeições constitucionais; ou seja, mutações constitucionais são reformas informais e mudanças constitucionais empreendidas por uma suposta interpretação evolutiva. [13]

Essa tese foi formulada pela primeira vez em fins do século XIX e inícios do século XX por autores como Laband (Wandlungen der deutschen Reichsverfassung, Dresden, 1895) e Jellinek (Verfassungsänderung und Verfassungswandlung, Berlim, 1906), e mereceu mais tarde conhecidos desenvolvimentos por Hsü-Dau-Lin (Die Verfassungswandlung, Leipzig, 1932). Como bem afirmam os professores Artur J. Jacobson (New York) e Bernhard Schlink (Berlim), em sua obra Weimar: A Jurisprudence of crisis (Berkeley: University of Califórnia, 2000, p. 45-46), o dualismo metodológico positivismo legalista-positivismo sociológico que perpassa toda a obra de Jellinek Verfassungsänderung und Verfassungswandlung (Berlim, Häring, 1906) e que serve de base para a tese da mutação constitucional (Verfassungswandlung), impediu o jurista alemão de lidar normativamente com o reconhecimento daquelas que seriam "as influências das realidades sociais no Direito". A mutação constitucional é assim tida como fenômeno empírico e não é resolvido normativamente: "Jellinek não apresenta um substituto para o positivismo legalista, mas apenas tenta suplementá-lo com uma análise empírica ou descritiva dos processos político-sociais". [14]

Na verdade, o conceito de mutação constitucional mostra apenas a incapacidade do positivismo legalista da velha Staatsrechtslehre do Reich alemão de 1870 em lidar construtivamente com a profundidade de sua própria crise paradigmática. E não nos parece que esse fenômeno possui similaridade no Brasil. E mesmo em Hsü-Dau-Lin [15] (referido pelo Ministro Eros Grau) e sua classificação "quadripartite" do fenômeno da mutação constitucional [16] não leva em conta aquilo que é central para o pós-segunda guerra e em especial para a construção do Estado Democrático de Direito na atualidade: o caráter principiológico do direito e a exigência de integridade que este direito democrático expõe, muito embora, registre-se, Lin tenha sido discípulo de Rudolf Smend, um dos primeiros a falar em princípios e espécie de fundador da doutrina constitucional alemã pós-segunda guerra.

Em síntese, a tese da mutação constitucional advoga em última análise uma concepção decisionista da jurisdição e contribui para a compreensão das cortes constitucionais como poderes constituintes permanentes. [17] Ora, um tribunal não pode mudar a constituição; um tribunal não pode "inventar" o direito: este não é seu legítimo papel como poder jurisdicional, numa democracia.

A atividade jurisdicional, mesmo a das cortes constitucionais, não é legislativa, muito menos constituinte (e assim não há o menor cabimento, diga-se de passagem, na afirmação do Min. Francisco Rezek, quando do julgamento da ADC n.º 1, quando este dizia que a função do STF é a de um oráculo (sic) que "diz o que é a Constituição").

De uma perspectiva interna ao direito, e que visa a reforçar a normatividade da constituição, o papel da jurisdição é o de levar adiante a tarefa de construir interpretativamente, com a participação da sociedade, o sentido normativo da constituição e do projeto de sociedade democrática a ela subjacente. [18] Um tribunal não pode paradoxalmente subverter a constituição sob o argumento de a estar garantindo ou guardando.

Há, portanto, uma diferença de princípio entre legislação e jurisdição (Dworkin). O "dizer em concreto" significa a não submissão dos destinatários – os cidadãos - a conceitos abstratalizados. A Suprema Corte não legisla (muito embora as súmulas vinculantes, por exemplo, tenham adquirido explícito caráter normativo em terrae brasilis).

Ao pretender que caibam reclamações contra as suas teses e não contra as suas decisões proferidas em casos propriamente ditos (observe-se, estamos tratando do controle difuso, cuja ratio é o exame de casos concretos e questões prejudiciais), o Supremo Tribunal Federal desloca a discussão jurídica para os discursos de fundamentação (Begründungsdiskurs), elaborados de forma descontextualizada. Passam a ser "conceitos sem coisas". E isso é metafísica, para utilizarmos uma linguagem cara à hermenêutica de cariz filosófico.

Em outras palavras, a tese esgrimida pelo Ministro Gilmar Mendes reduz a discussão jurídica a questões de justificação da validade das normas. Ora, a discussão jurídica é sempre concreta e, confessemos, pela simples razão de que não somos metafísicos, não somos seres numenais: até mesmo quando se faz controle concentrado, há concretude. Afinal, há muito já se disse que a filosofia tem de descer dos céus para a terra, uma vez que os problemas estão cá em terra firme e não no mundo das idéias platônicas.

Registre-se, neste ponto, que até mesmo a sofisticada argumentação de cunho hermenêutico do Ministro Eros Grau perde terreno, mesmo que ele pretenda vê-la ancorada na dicotomia "texto e norma", assim como na repercussão dessa tese na decisão de "mutação constitucional". Ao que se depreende das assertivas do Min. Eros Grau, "tudo vira norma" e com pretensões universalizantes (podendo, na mutação constitucional, o próprio texto soçobrar, colocando-se em lugar deste não apenas uma nova norma, mas, sim, um novo texto, em face dos limites semânticos daquele texto que tinham que ser ultrapassados – nas suas palavras - era "obsoleto"). [19]

Os votos proferidos até agora adentram, assim, na discussão acerca do papel do direito e dos limites da "função corretiva" da jurisdição (em especial, da jurisdição constitucional). A interpretação da Constituição pode levar a que o STF produza (novos) textos, isto é, interpretações que, levadas aos limite, façam soçobrar os limites semânticos do texto no modo que ele vinha sendo entendido na (e pela) tradição (no sentido hermenêutico da palavra)?

Veja-se, nesse sentido, que o Ministro Eros Grau sustenta – e, com isso, concorda com o Ministro Gilmar –que cabe ao STF não apenas mudar a norma, "mas mudar o próprio texto constitucional" (o texto do inciso X do art. 52 foi, efetivamente, alterado). Veja-se: o Ministro Eros Grau se pergunta se o Ministro Gilmar Mendes, ao proceder a "mutação constitucional" não teria "excedido a moldura do texto, de sorte a exercer a criatividade própria à interpretação para além do que ao intérprete incumbe. Até que ponto o intérprete pode caminhar, para além do texto que o vincula? Onde termina o legítimo desdobramento do texto e passa ele, o texto, a ser subvertido?"

E ele mesmo reponde: "não houve qualquer anomalia de cunho interpretativo, pois o Ministro Gilmar teria apenas feito uma "autêntica mutação constitucional": "Note-se bem que S. Exa. não se limita a interpretar um texto, a partir dele produzindo a norma que lhe corresponde, porém avança até o ponto de propor a substituição de um texto normativo por outro. Por isso aqui mencionamos a mutação da Constituição."

Ocorre que, ao mesmo tempo, o Min. Eros Grau admite que "a mutação constitucional é transformação de sentido do enunciado da Constituição sem que o próprio texto seja alterado em sua redação, vale dizer, na sua dimensão constitucional textual. Quando ela se dá, o intérprete extrai do texto norma diversa daquelas que nele se encontravam originariamente involucradas, em estado de potência", para, logo em seguida, acentuar que "há, então, mais do que interpretação, esta concebida como processo que opera a transformação de texto em norma. Na mutação constitucional caminhamos não de um texto a uma norma, porém de um texto a outro texto, que substitui o primeiro."

Por tudo isso, o Min. Eros Grau dirá que "pouco importa a circunstância de resultar estranha e peculiar, no novo texto, a competência conferida ao Senado Federal - competência privativa para cumprir um dever, o dever de publicação (=dever de dar publicidade) da decisão, do Supremo Tribunal Federal, de suspensão da execução da lei por ele declarada inconstitucional. Essa peculiaridade manifesta-se em razão da circunstância de cogitar-se, no caso, de uma situação de mutação constitucional".

Certo então, para o Ministro, que na mutação constitucional não apenas a norma é nova, mas o próprio texto normativo é substituído por outro. Entretanto, ele mesmo reconhece que "em casos como tais importa apurarmos se, ao ultrapassarmos os lindes do texto, permanecemos a falar a língua em que ele fora escrito, de sorte que, embora tendo sido objeto de mutação, sua tradição seja mantida e ele, o texto dela resultante, seja coerente com o todo, no seu contexto. Pois é certo que a unidade do contexto repousa em uma tradição que cumpre preservar. Recorro a Jean-Pierre Vernant para dizer que o novo texto, para ganhar sentido, deve ser ligado e confrontado aos demais textos no todo que a Constituição é, compondo um mesmo espaço semântico."

Entretanto, nossa leitura permite-nos entender que o Ministro Eros Grau reconhece, com apoio em Jean-Pierre Vernant, que sempre há que se indagar, quando se está frente a uma mutação constitucional, se o texto resultante da mutação mantém-se adequado à tradição (= à coerência) do contexto, reproduzindo-a, de modo a ele se amoldar com exatidão. A mutação não é uma degenerescência, senão uma manifestação de sanidade do ordenamento."

Entendemos que, nesse exato contexto, a pergunta que não foi respondida é: mas o que é a tradição? De que tradição se está falando? O que diz a tradição que consubstancia o texto e a norma do art. 52,X? Em que sentido a "substituição" do texto constitucional, efeito em nome de uma mutação, deixa o novo "texto" em harmonia com a tradição? Não é exatamente para mudar a tradição que se faz "mutação"? Mas, então, se se faz mutação para alterá-la, como lhe ser coerente e fiel? É nesse sentido que a posição de Vernant é tautológica, incorrendo em um paradoxo. E paradoxos são coisas sobre as quais não podemos decidir.

Mais ainda: se o texto "mutado" é obsoleto - como textualmente diz o Min. Eros Grau - como admitir que o Supremo Tribunal Federal "faça" outro, que confirme a tradição? De que modo se chega a conclusão de que "um texto constitucional é obsoleto"? E de que modo é possível afirmar que, "por ser obsoleto", o Supremo Tribunal Federal pode se substituir ao processo constituinte derivado, único que poderia substituir o texto "obsoleto"? A tradição não residiria exatamente no fato de termos adotado – e ratificado em 1988 – o sistema misto de controle de constitucionalidade? A tradição não estaria inserida na própria exigência de remessa ao Senado, buscando, assim, trazer para o debate - acerca da (in)validade de um texto normativo – o Poder Legislativo, único que pode tratar do âmbito da vigência, providência necessária para dar efeito erga omnes à decisão que julgou uma causa que não tinha uma tese, mas, sim, uma questão prejudicial?

Lembremos, de todo modo, que - embora esse não seja, nem de longe, o foco principal da tese do Min. Eros Grau - sempre se corre o risco, toda vez que se colocar demasiada ênfase nos discursos de validade, de aproximar o direito de determinadas teses realistas, reduzindo e enfraquecendo o papel da doutrina e das demais instâncias de formação do discurso jurídico, circunstância que nos faz ressaltar, aqui, por extrema justiça, o papel histórico do doutrinador e Professor Eros Roberto Grau na formação do discurso crítico sobre o direito em tempos duros sem constituição e que influenciou e influencia uma geração de juristas. Entretanto, tal problemática parece se insinuar, de certo modo, quando o Ministro acentua, em seu voto, que "o discurso da doutrina [=discurso sobre o direito] é caudatário do nosso discurso, o discurso do direito. Ele nos seguirá; não o inverso."


VI. Aportes Finais

Numa palavra final: essa "redução" do direito ao plano da validade, a confundir a perspectiva jurisdicional e a legislativa, não é novidade, valendo referir o modo como isto é visto pela teoria da argumentação jurídica proposta por Robert Alexy. Veja-se, nesse sentido, a descabida crítica que Alexy [20] faz à distinção de Klaus Günther faz entre "discursos de fundamentação e discursos de aplicação", na qual fica claro um deslocamento da esfera de tensão dessa distinção em direção aos discursos de validade ("the application of norms, too, can be considered a justification of norm; in its logical form it only differs from is generally called "justification os norms" insofar, as its object of is not na universal but an individual norm"). Por isso a argumentação é hispostasiada, isto é, tudo se resume a fórmulas matemáticas e a cálculos de custo-benefício, que, por ter pretensão corretiva, acaba se substituindo ao próprio direito. Com efeito, Alexy resume essa tensão à validade do Direito, buscando uma espécie de discurso com validade universal. Esse discurso de validade, ao que indica, conteria a "idéia" que daria uma validade universalizante das diversas situações aplicativas (norma universal, nas palavras de Alexy).

No Brasil, essa tese – a de Alexy e a do Supremo Tribunal Federal na Rcl n.º 4335-5 - pode dar (ainda mais) respaldo aos defensores das súmulas vinculantes e a distorções no seu processo inadequado de aplicação. De fato, ao se constituírem em discursos de validade construídos para resolver problemas futuros que nela se "subsumam" (não parece haver dúvida a esse respeito, porque a súmula busca impedir a construção de discursos de aplicação - Anwendugsdiskurs), as súmulas vinculantes parecem encaixar-se na tese de que tudo se resume a discursos de validade, uma vez que nos discursos de justificação (validade) já haveria a referência a muitas situações construídas e experenciadas. [21]

Não se pode deixar de lembrar que, para os discursos de justificação – e essa tese é subscrita por Alexy -, a questão é saber qual norma universal é correta. Mas do fato de que essas duas questões (aplicação e justificação) devem ser distinguidas, não implica a existência de dois tipos de discurso essencialmente diferentes; para ele, é possível que essas duas questões iniciem duas operações diferentes dentro de uma mesma forma de discurso e, então, leve a duas variações de uma mesma forma de discurso.

A pergunta que fica é: como saber em que circunstâncias uma norma "universal" é correta ou "qual" das normas é correta? Afinal, correção normativa no Direito é antes de tudo uma questão legislativo-democrática, assegurados os direitos fundamentais garantidores da eqüiprimordialidade das autonomias pública e privadas (Habermas). Além isso, o problema é saber se é suficiente descobrir que - e quando - uma norma universal é correta, uma vez que uma norma pode ser correta, mas inaplicável ao caso concreto. Talvez o problema esteja na exigência de Alexy, de que um juízo em fase de uma situação concreta deve se justificar também em razão da sua universalidade, ou seja, ele deve ser adequado a toda e qualquer situação que àquela se assemelhe. Por aqui – e parece que a questão relacionada ao destino a ser dado ao controle difuso está inexoravelmente ligada a essa querela -, parece que a tese da hipostasiação da discussão acerca da validade toma corpo a cada dia. Com isso, soçobra a realidade.

Afinal, cabe ao Supremo Tribunal Federal "corrigir" a Constituição? A resposta é não. Isso faria dele um poder constituinte permanente e ilegítimo. Afinal, quais seriam os critérios de correção, uma suposta "ordem concreta de valores", um "Direito Natural" no estilo de Radbruch?...

Agregue-se a essa relevante questão hermenêutica a seguinte preocupação: decisões do Supremo Tribunal Federal, como a da Reclamação sob comento, podem incorrer no equívoco de confundir as tarefas constituídas daquelas constituintes, o que traduziria, portanto, uma séria inversão dos pressupostos da teoria da democracia moderna a que se filia a Constituição da República. Volta-se à discussão acerca do direito enquanto paradigma, no seguinte ponto: qual é o papel do poder judiciário (ou da justiça constitucional?) É o de elaborar discursos de validade? É o de construir discursos de validade que "contenham" de antemão todas as hipóteses de aplicação? Mas, se assim fosse, a pergunta que sempre fica(ria) é: quais as condições de possibilidade que tem esse poder de Estado de ultrapassar esse limite tensionado e tensionante entre validade e aplicação? A discussão acerca da validade prescinde da aplicação?

Tais questões, ao que tudo indica, devem preocupar sobremodo a comunidade jurídica. E não provocar – como está a parecer – um silêncio eloquente!

Ainda, finalmente, uma observação: as sentenças de um tribunal são simbólicas e suas conseqüências o são quase que integralmente, até o gesto do carrasco que, real por excelência, é imediatamente também simbólico em outro nível, como bem alerta Castoriadis. Ou seja, um sistema de direito, que se constrói a partir de doutrina, jurisprudência, legislação, etc, existe socialmente enquanto sistema simbólico. As coisas não se esgotam no simbólico (os atos reais, individuais ou coletivos, o trabalho, o consumo, a guerra, o amor, a natalidade, não são, nem sempre, nem diretamente, símbolos); mas elas só podem existir no simbólico e são impossíveis fora de um simbólico. [22] Assim, as conseqüências de determinados gestos, atos, decisões, são mais graves no aspecto do seu significado simbólico do que no seu aspecto "real". É possível, desse modo, apreender a dimensão da crise que atravessa o direito a partir das representações simbólicas. Dito de outro modo: como no gesto do carrasco, talvez o mais grave seja o que este representa simbolicamente. Nessa linha, a decisão do Supremo Tribunal Federal, por mais que esteja imbuída de um sentido pragmático e sustentada na melhor ciência jurídica, pode (e, certamente assim será) representar uma afirmação do imaginário jurídico que justamente levou àquilo que hoje é combatido: o excesso de recursos e a multiplicação das demandas. Se o Supremo Tribunal Federal pode fazer mutação constitucional, em breve essa "mutação" começará a gerar – como se já não existissem à saciedade [23] - os mais diversos frutos de cariz discricionário (portanto, positivista, no sentido em que Dworkin critica as teses de Hart). Exatamente porque no Brasil cada um interpreta como quer, decide como quer e recorre como quer (e isso parece recorrente na cotidianidade dos fóruns e tribunais da República), é que faz com que cresçam dia-a-dia as teses instrumentalistas do processo, como que a mostrar, a todo instante, que as teses de Oscar Von Büllow não foram (ainda) superadas. A solução tem sido essa: corte-se o acesso à justiça. Sob pretexto de agilizarmos a prestação jurisdicional, criamos mecanismos para impedir o processamento de recursos. E quem perde com isso é a cidadania que vê assim negada a jurisdição.


Notas

01 Até a publicação deste texto, o julgamento está no seguinte ponto: "Após o voto de vista do Senhor Ministro Eros Grau, que julgava procedente a reclamação, acompanhando o Relator; do voto do Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, julgando-a improcedente, mas concedendo habeas corpus de ofício para que o juiz examine os demais requisitos para deferimento da progressão, e do voto do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, que não conhecia da reclamação, mas igualmente concedia o habeas corpus, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Ricardo Lewandowski. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello e a Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie. Plenário, 19.04.2007".

02No original: "5. Eine Partei ist nicht schon dann verfassungswidrig, wenn sie die obersten Prinzipien einer freiheitlichen demokratischen Grundordnung (vgl. BverfGE 2, 1[12f.]) nicht anerkenn; es muß vielmehr aktiv, kämpferische agressive Haltung gegenüber der bestehenden Ordnung hinzukommen" (in: Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, hrg. von den Mitgliedern des Bundesverfassungsgerichts, 5. Band, J. C. B. Mohr (Paul Siebeck). Tübingen, 1956, p. 85).

03Não vamos discutir, aqui, o problema da relação entre o papel do Senado (art. 52,X,CF) e a questão da "repercussão geral" introduzida pela EC 45/04, regulamentada no art. 543-B do CPC. Observe-se a complexidade do problema: além do poder que o Supremo Tribunal Federal terá a partir da equiparação do controle difuso ao controle concentrado, tem-se que aquela Corte pode, agora, determinar a interpretação de uma norma constitucional e impô-la a todos os processos em sede de controle difuso. Podem ser anuladas, inclusive, as decisões já proferidas pelas diversas instâncias do Poder Judiciário. Portanto, como bem alerta Fernando Faccury SCAFF (Novas Dimensões do Controle de Constitucionalidade no Brasil: Prevalência do Concentrado e Ocaso do Difuso. In: Revista Dialética do Direito Processual n.50, São Paulo, 2007, pp. 20 e segs), isto é mais do que uma súmula vinculante: é uma decisão única, tomada por seis ministros (maioria absoluta), que pode desfazer as decisões adotadas pelos Tribunais de todo o País. A exigência de quorum qualificado (oito votos) é apenas para o juízo de admissibilidade e não para a votação do mérito. É um poder jamais visto no Brasil nas mãos do STF" (id. ib.).

04O que não significa dizer em concreto, quando direitos subjetivos não estão em questão, ou seja, no sentido esse em que o termo é comumente emprestado por doutrina e jurisprudência do controle da constitucionalidade.

05 STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica, Forense, 2ª ed., 2004, pp. 479 e ss.

06 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica e Aplicação do Direito: os limites da modulação dos efeitos em controle difuso de constitucionalidade - O caso dos crimes hediondos. Constituição, Sistemas Sociais e Hermenêutica. Anuário do Programa de Pós-Graduação em Direito da Unisinos. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2006, pp. 115 e ss.

07 STRECK, Hermenêutica e Aplicação, op.cit.

08 STRECK, Hermenêutica e Aplicação, op.cit.

09 Cf. CANOTILHO, JJ Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6ª ed. Coimbra, Almedina, 2002, p. 950.

10 Cf. MIRANDA, Jorge. Manuel de Direito Constitucional II. Coimbra, Copimbra Editora, 1996, pp. 265 e segs.

11Ver, nesse sentido, MEDEIROS, Rui. A decisão de inconstitucionalidade. Lisboa, Universidade Católica, 1999, p. 836 e 837, referindo a doutrina de: Nunes de Almeida, A justiça constitucional no quadro das funções estaduais, nomeadamente espécies, conteúdo e efeitos das decisões sobre a constitucionalidade de normas jurídicas. In: Justiça Constitucional e espécies, conteúdo e efeitos das decisões sobre a constitucionalidade das normas. Lisboa: Tribunal Constitucional, 1987, p. 133; TELES, Miguel Galvão. A concentração da competência para o conhecimento jurisdicional da inconstitucionalidade das leis. In: Revista O Direito. Lisboa, 1971, p.209; ALMEIDA, J.M. Ferreira de. A justiça constitucional no quadro das funções do Estado, op. cit., p.72; ENTERRIA, Eduardo Garcia de. La Constitución como norma y el Tribunal Constitucional. Madrid, Tecnos, 1982, p. 141 e 142; ENGELHARDT, Dieter. Das richterliche Prüfungsrecht im modernen Verfassungsstaat. In: Jör, 1959, p. 136 e RUGGERI, Antonio. Storia di un "falso" – L''efficacia inter partes delle sentenze di regetto della Corte Constituzionalle. Milano, 1990, p. 41 e segs; STRECK, Lenio Luiz, Jurisdição Constitucional e Hermenêutica, op.cit.

12Cfe. SIMON, Helmut. La jurisdicción Constitucional. In: Benda, Maihofer, Vogel, Hesse, Heide. Manual de Derecho Constitucional. 2ª ed. Madrid, Marcial Pons, 2001, p. 843.

13 MENDES, Gilmar Ferreira. "A eficácia das decisões de inconstitucionalidade – 15 anos de experiência" in: SAMPAIO, José Adércio Leite. !5 anos de Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p.207.

14 JACOBSON, Artur J. e SCHLINK, Bernhard. Weimar: A Jurisprudence of crisis (Berkeley: University of Califórnia, 2000, p. 46; pp. 54-57.

15 De todo modo, lembremos que Hsü Dau Lin escreveu o seu texto no contexto da República de Weimar, havendo todo um debate sob a Lei Fundamental, por exemplo, com Konrad Hesse e Böckenförde.

16 HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. Belo Horizonte: del Rey, 2002, p.104-105. GARCÍA-PELAYO, Manuel. Derecho Constitucional Comparado. Madrid: Alianza, 1993, p. 137-138. VERDU, Pablo Lucas. Curso de Derecho Político. Madrid: Tecnos, 1984, v. 4, p. 179-180.

17 Sabe-se que na época em que foram escritas as obras de Lin e Smend, não havia Tribunais Constitucionais nos moldes construídos posteriormente. A tese da mutação não significa que não tenha sido dado valor fundamental às práticas políticas no parlamento ou no governo. A conseqüência das teses "mutacionistas" em tempos de "cortes constitucionais" poderia ser diferente.

18CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Devido processo legislativo: Uma justificação democrática do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis e do processo legislativo. 2.ª ed. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. Também CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Poder Constituinte e Patriotismo Constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006.

19 No fundo, toda (ess)a discussão é similar à pretensão de universalização das súmulas vinculantes; ou seja, as súmulas vinculantes podem ser entendidas como uma hipostasiação de discursos de justificação, isto é, o pólo de tensão passa a estar somente no plano da validade do discurso jurídico.

20Cf. ALEXY, Robert. Justification and Application of Norms. In: Ratio Juris, vol. 6, no. 2, jul 1993.

21Cf. STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso. 2ª ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.

22 Cf. CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da sociedade. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982, p.142. Também STRECK, Verdade e Consenso, op.cit., onde é feita uma crítica às conseqüências de decisões que extrapolam os limites semânticos dos textos jurídicos.

23Por todos, veja a "mutação constitucional" feita recentemente pelo STJ no art. 514 do Código de Processo Penal. Com efeito, considerando ultrapassada a garantia da defesa prévia de quinze dias que o CPP concedia ao funcionário público quando processado, o STJ editou a Súmula 330, alterando, não a norma do art. 514, mas o texto...!





STRECK, Lenio Luiz; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de et al. A nova perspectiva do Supremo Tribunal Federal sobre o controle difuso: mutação constitucional e limites da legitimidade da jurisdição constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1498, 8 ago. 2007. Disponível em: . Acesso em: 12 jan. 2010.
 
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